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Eterna Briosa

“Se jogasses no céu, morreria para te ver”, é provavelmente uma das melhores frases que pode caracterizar o espírito dos adeptos da Académica de Coimbra, a instituição desportiva mais antiga do país, ainda em atividade. Não é apenas a Coimbra que esta Académica pertence, que seguida e adorada por todo o mundo, transporta o espírito de todos os que, em algum momento da sua vida, trajaram de preto e branco.

Vencer a primeira Taça de Portugal poderia ser a melhor forma de introduzir neste texto a importância da Académica de Coimbra no mundo do futebol. No entanto, há uma data que todos os sócios e simpatizantes do clube conseguem reconhecer: 22 de junho de 1969. Nesse dia, no estádio Nacional, disputou-se a final da Taça de Portugal entre a Académica e o Benfica, que mesmo não vencendo o jogo, é por ventura o ponto alto da história do clube dos estudantes.

A importância deste jogo prende-se essencialmente com a importância política e não desportiva. Em 1969 os estudantes de Coimbra estavam em guerra aberta com o regime, na famosa crise estudantil, e compareceram em massa ao Jamor. Receando o conflito, o Presidente da República Américo Thomaz e outros representantes do Estado Novo não assistiram ao jogo no estádio, como de resto é habitual nesta prova e o encontro não foi sequer transmitido na televisão. Nas bancadas do Jamor, milhares estudantes procuravam pela melhor oportunidade para expor as tarjas antifascismos e reivindicativas, que traziam escondidas no acesso ao estádio, sendo que vários adeptos foram detidos ainda antes do apito inicial. Em campo, os jogadores da Académica não foram indiferentes ao movimento estudantil e aderiram à causa, entrando em campo, com uma capa académica aberta e caída, em sinal de protesto. O Benfica, adversário em campo, também demonstrou solidariedade para com a Académica e os jogadores também entraram de capa estudantil ao ombro, um comportamento aplaudido pelo clube de Coimbra e seus adeptos presentes no estádio Nacional. Cartazes com palavras de ordem circulavam por todo o Jamor durante 90 minutos, contrariando as movimentações da polícia e não uma há uma pessoa que tenha assistido ao jogo, há 50 anos atrás, que consiga relatar um encontro de futebol mais emocionante na sua vida. Um jogo que define uma geração, uma posição política e social perante um regime que “caia de podre” e um clube que se assume como um dos mais importantes da história de Portugal, pelo palmarés, pelo carisma e por ter sido um símbolo de esperança, num dos períodos mais negativos da história recente de Portugal.

“Ser da Académica é ser diferente”

Passados mais de 50 anos e mesmo sendo hoje um clube autónomo, a Académica de Coimbra mantém uma ligação afetiva com todos os estudantes que frequentaram a Universidade de Coimbra, ao longo dos anos. Por isso mesmo, a Briosa é seguida e amada por adeptos no mundo inteiro. Pedro Roxo, ex-jogador e atual presidente do clube é um dos muitos adeptos que nasceu a ser adepto da Académica. Numa entrevista à IN Corporate Magazine, Pedro Roxo, vinca que “com uma semana, era sócio da Académica. Estive toda a vida ligado ao clube, desde o meu tempo como jogador, que começou nas escolinhas, até continuar a acompanhar o clube como adepto, sócio e presidente. No entanto, muitos adeptos da Académica surgem por causa da Universidade de Coimbra, que é a maior do país. Existe uma base histórica que liga as duas instituições e quem passa pela Universidade, aprende a amar a Académica, venha essa pessoa do Porto, de Lisboa ou de outro país. Ser da Académica é ser diferente e isso vem da génese do clube”.

A ligação histórica à academia será sempre evidente, no entanto não são apenas os estudantes que rapidamente se apaixonam pela eterna briosa. Em 2012 Mário Wilson, hoje já falecido e conhecido jogador e treinador de futebol, classificou a Académica como um dos seus dois amores, uma frase que rapidamente poderia ser citada por praticamente qualquer jogador que tenha em algum momento da sua cadeira, vestido o manto negro da Académica. Hilário, Toni, Artur Jorge, Vítor Paneira, Sérgio Conceição, Dimas, João Tomás são apenas alguns históricos do futebol nacional que passaram pela Académica a deixaram o seu registo no clube, sem esquecer os exemplos de Éder, Cédric e Adrien Silva, três campeões europeus pela seleção nacional, que conquistaram a Taça de Portugal em 2012, a segunda da história do clube, frente ao Sporting CP, no Jamor. “Todos os jogadores ficam com uma ligação muito grande à Académica. Basta ouvir alguns atletas falarem, seja aqueles que partiram para grandes palcos, sejam aqueles que tiveram uma carreira mais humilde. Ter jogado na Académica é significativo para qualquer jogador”, garante o presidente da Académica de Coimbra.

Pela massa adepta, a Académica é um clube que extravasa as limitações geográficas, no entanto Coimbra será sempre a casa e o coração do clube. De forma a fortalecer a ligação entre a Académica e a cidade, a direção do clube tem como bandeira para este mandato promover dinâmicas que visem unir os conimbricenses com a instituição e que se torne um hábito ir ao Estádio Cidade de Coimbra, apoiar a briosa “como se fosse uma pessoa da família”, palavras célebres de Joaquim Isabelinha, figura mítica da Académica.

Formação na base do futuro
No total, mais de 400 atletas jogam futebol sob a alçada da Académica, desde as crianças da escolinha briosa, aos profissionais do futebol sénior. No que respeita ao futebol, não existe no distrito e na região um clube que se aproxime da dimensão da Académica de Coimbra, fazendo acrescer a responsabilidade social da instituição. Sobre o cariz social do clube, com base assente na formação, Pedro Roxo afirma que “temos no seio do clube uma preocupação não apenas em formar pessoas, mas também adultos responsáveis. Dentro da nossa academia, temos uma sala de estudo, com explicações e há obrigatoriedade dos miúdos que vivem na academia para com os estudos. Enquanto residentes, os nossos jovens vêm para cá jogar, mas também estudar e ter aproveitamento escolar. Um dos casos que mais nos orgulha é o do Dani, que joga na equipa principal e está na Universidade, onde entrou com uma média elevada e no final do primeiro ano, recebeu um prémio de mérito, por ser um dos melhores alunos da sua faculdade”.

De resto a formação assume um papel de destaque no que respeita ao futuro do clube, uma vez que, tendo em conta a inflação dos custos do futebol, a longo prazo a formação é a melhor solução para uma base sólida, em termos não só financeiros, mas também desportivos e uma realidade necessária para todos os clubes portugueses.

Académica com garra
Pela primeira vez este ano, a Académica equipa Claw, uma marca portuguesa relativamente recente no mercado, que chega agora aos campeonatos profissionais e que irá vestir os estudantes nas próximas temporadas. Bruno de Carvalho, responsável máximo pela Claw, vinca em palavras à nossa revista, que “o sucesso da Académica é o nosso sucesso e esta parceria é uma forma não só de darmos um passo em frente em termos de marca e em termos empresariais, como também é um orgulho pessoal. A dimensão da Académica é reconhecida por todos, embora admita, que não tinha noção da verdadeira grandeza deste clube, que ultrapassa os limites nacionais. É uma marca mundial e com paciência o clube voltará à primeira divisão nacional, porque merece e porque tem uma forte estrutura diretiva”.

Sociedade Anónima Desportiva

Uma das bandeiras eleitorais de Pedro Roxo para este segundo mandato, foi a criação de uma Sociedade Anónima Desportiva, uma SAD, com vista o investimento interno, que permita resolver vários dos problemas financeiros da Académica e potencialize o clube no principal patamar do futebol português. “Neste momento os clubes portugueses têm de encontrar uma maneira de se sustentar perante a forma como o futebol está inflacionado, a nível mundial. As SADs abrem portas ao investimento externo e podem solucionar problemas financeiros que impedem os clubes de atingir maiores voos. O lugar da Académica é entre os melhores e é nesse sentido que estamos a trabalhar”. Neste momento o clube está a ultimar os detalhes com vista a criação de uma SAD, que será proposta aos sócios, “o mais rapidamente possível”.