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Raças Autóctones, por Nuno Russo, Secretário de Estado da Agricultura e do Desenvolvimento Rural

Nuno Russo, Secretário de Estado da Agricultura e do Desenvolvimento Rural

A posição geográfica que Portugal ocupa no extremo Sul da Europa, ponto de passagem e fixação para muitos povos ao longo dos tempos; considerando que é um país com uma reduzida dimensão, Portugal apresenta uma enorme variabilidade de condições climáticas, orográficas, de solos, de estruturas fundiárias, de tradições e costumes que resulta numa acentuada diversidade técnicas de produção agrícola e pecuária.

Em consequência desta diversidade, os animais domésticos foram sendo criados e selecionados para fazer face às necessidades de alimento, vestuário, proteção e companhia dos nossos ancestrais, numa adaptação harmoniosa às condições ambientais existentes nos diferentes tipos de territórios.

Este conjunto de fatores resultou numa elevada diversidade de Recursos Genéticos Animais (RGAn), representada por 50 raças autóctones, oficialmente reconhecidas, das diferentes espécies pecuárias (15 raças de bovinos, 16 raças de ovinos, 6 raças de caprinos, 3 raças de suínos, 6 raças de equídeos e 4 raças de galináceos) e 11 raças de Canídeos.

Este património único que urge salvaguardar, torna o nosso país um foco de grande importância pela diversidade dos seus RGAn. Esta biodiversidade cria enormes desafios

 e responsabilidade a Portugal e aos seus criadores na forma como os RGAn são mantidos, geridos e melhorados de forma sustentável, constituindo um grande desafio a gestão de um tão valioso património genético e tão elevado número de raças, algumas com efetivos extremamente reduzidos.

Os sistemas de produção característicos das raças autóctones são predominantemente extensivos, o que permite um aproveitamento mais racional dos recursos naturais, de que outras raças mais exigentes não conseguem tirar partido, acentuando as potencialidades do carácter multifuncional da agropecuária.

Estes sistemas de produção em regime extensivo, com recurso às raças autóctones, garantem uma produção sustentável, promovem a ocupação e a manutenção dos territórios, promovem o desenvolvimento e dinamização do interior do país e das zonas rurais, a criação de postos de trabalho, incentivando novas atividades económicas associadas e geradora de cadeias curtas de abastecimento. Em resumo, desempenham um papel de grande importância para a preservação da biodiversidade em geral, revelando-se sistemas equilibrados e sustentáveis, que favorecem a conservação dos recursos naturais, a mitigação dos processos de desertificação, desempenho de funções ecológicas, económicas e paisagísticas, sendo uma frente ativa na prevenção de fogos rurais.

As raças autóctones no sistema de pecuária extensiva são possíveis de criar, manter e melhorar em territórios onde não é possível exercer outro tipo de atividade; associado a sistema Lameiros e Baldios, ao Montado de Sobro e Azinho, em Soutos, tirando o melhor, e por vezes o único, proveito que estes nossos territórios têm para oferecer e valorizando o tipo de sistema agro-silvo-pastoril.

Para fazer face às necessidades alimentares da população, salvaguardando a diversidade e segurança dos alimentos e da qualidade alimentar, mas provendo formas de produção mais sustentáveis que protegem o ambiente e a saúde do Homem e dos animais, a União Europeia apresentou o “Pacto Ecológico Europeu” e a Estratégia “ Do Prado ao Prato” no sentido de desenvolver sistema alimentares mais sustentáveis, assegurar a melhoria das condições de saúde e de bem-estar dos animais, combater o aparecimento da resistência antimicrobiana, aperfeiçoar a informação ao consumidor sobre os alimentos reduzir o desperdício alimentar, promover o consumo alimentar sustentável, assim como apoiar a investigação e a inovação nestas áreas.

Alinhada com a estratégia europeia foi recentemente aprovada a Agenda da Inovação para a Agricultura 2020-2030, a qual visa contribuir para uma agricultura mais inovadora, eficiente e sustentável para a promoção do bem-estar e da saúde da sociedade portuguesa, através da consciencialização da sua alimentação.

A Agenda prevê desenvolver iniciativas que permitam integrar a promoção da saúde animal e a sanidade vegetal, numa perspetiva integradora da saúde dos ecossistemas a várias escalas, com vista a proporcionar o bem-estar da população, prosseguindo o princípio de «Uma Só Saúde». Estas políticas elevam assim a importância da conservação do património genético animal e a promoção dos sistemas de produção, que promovam a criação das raças autóctones, associadas a produtos únicos, de reconhecida qualidade certificada e de elevado valor comercial, muito associadas a produções ambientalmente mais sustentáveis e que valorizam os produtos locais e promovem as áreas rurais.

Algumas destas ações vêm sendo promovidas pelo Ministério da Agricultura, também, através da Direção Geral de Alimentação e Veterinária (DGAV) com o apoio das Associações de Criadores na implementação de planos de conservação e melhoramento genético das raças autóctones, e apoiadas por medidas específicas do PDR2020. O Programa de Desenvolvimento Rural que, nos últimos cinco anos, apoiou em cerca de 39 milhões de euros a preservação das raças autóctones ameaçadas, apoio esse que se pretender manter, face à valorização do setor pecuário e de toda a sua fileira.

Pretendemos também apostar na formação dos agricultores, na inovação, no conhecimento e na tecnologia, por forma a poder maximizar o potencial produtivo das raças autóctones, garantido também a sua melhor gestão, que se pretende sustentável, também ao nível da utilização dos recursos naturais, e nos territórios onde as mesmas são originárias e aumentar a perceção dos consumidores para a mais-valia do consumo de produtos alimentares com características específicas identificáveis e reconhecíveis.

A produção, promoção e consumo dos produtos endógenos associados às raças autóctones, com uma certificação diferenciadora e uma rotulagem diferenciada (DOP’s; IGP’s), e também relacionadas a argumentos ecológicos associados ao seu modo de gestão e de produção, são determinantes para incrementar a valorização das raças autóctones e dos produtos transformados de qualidade, e um retorno de rendimento justo aos produtores/criadores, incentivando à renovação geracional e à fixação de população nas áreas rurais, criando oportunidade  para a dinamização das economias locais através da relação sinérgica entre produtos agroalimentares, gastronomia e turismo, tendo sempre em vista o desenvolvimento rural.