Dona de um império internacional que se estende da banca às telecomunicações, passando pelo cimento e pelo petróleo, Isabel dos Santos é considerada a mulher mais rica de África, com uma fortuna estimada em 3,4 mil milhões de dólares.
Passou uma semana desde a decisão do Tribunal Provincial de Luanda pelo arresto preventivo das contas bancárias pessoais de Isabel dos Santos. Desde então, esta história tem feito correr muita tinta. Nas suas últimas declarações, a empresária Angolana afirma que o pagamento de salários está em causa. Mas em comunicado a PGR de Angola afirma que a providência cautelar não afeta os postos de trabalho, nem o normal funcionamento das empresas.
A 30 de dezembro o país e o mundo acordaram com a notícia de que o Tribunal Provincial de Luanda determinou o arresto preventivo de contas bancárias pessoais da empresária angolana Isabel dos Santos, de Sindika Dokolo e de Mário da Silva, o principal gestor da empresária, bem como de nove empresas angolanas nas quais detêm participações sociais.
Desde então, todos os dias têm sido acrescentadas novas informações a esta história torna-se cada vez mais complexa.
Aquando da decisão do arresto das contas e participações, o Tribunal Provincial de Angola responsabilizou também Eduardo dos Santos por favorecimento da filha em negócios que prejudicaram o Estado em mais de mil milhões de euros. Está em causa o alegado desvio de cerca de 115 milhões de dólares e o favorecimento da filha no comércio de diamantes.
Diz ainda o tribunal que “o anterior chefe de Estado orientou a Sodiam a vender”, às empresas relacionadas com Isabel dos Santos e o marido, “os diamantes a um preço inferior ao de mercado, causando prejuízo à empresa do Estado (Sodiam)”. Foram quatro as empresas de Isabel dos Santos e de Sindika Dokolo que terão vendido diamantes nestas condições no exterior, “obtendo avultados lucros sem que o Estado angolano” tivesse qualquer parte nos mesmos. Os prejuízos para o Estado angolano estão calculados “em 1.136.996.825, 56 dólares”.
A decisão de arrestar as participações de Isabel dos Santos e do seu marido na operadora Unitel, no banco BFA, na ZAP Media, na Cimangola II, na Ciminvest, na Continente Angola e na Sodiba é justificada com o facto dos visados estarem a “ocultar o património obtido às custas do Estado, transferindo-os para outras entidades”. Paralelamente, é apontada como outra razão a alegada intenção de Isabel dos Santos alienar a participação que detém na operadora Unitel, sendo mesmo citadas informações que os serviços secretos de Angola terão transmitido à Justiça angolana.
Ainda no dia em que a notícia se tornou pública, Isabel dos Santos reagiu na sua página do Twitter. “Gostaria de deixar uma mensagem de tranquilidade e confiança às minhas equipas. Vamos continuar, todos os dias, em todos os negócios, a dar o nosso melhor e a lutar por aquilo que eu acredito para Angola. O caminho é longo, a verdade há de imperar. Unidos somos mais fortes”.
Mais recentemente, num outro post, Isabel dos Santos garante que as empresas que gere “estão condenadas à morte”. “Hoje empregam mais de 10.000 pessoas. Diante dessa tentativa de espoliação, incentivei as minhas equipas e todas as famílias ligadas ao destino das minhas empresas a não cederem à dúvida nem ao desânimo”, disse. E acrescentou que, apesar de “lutar com calma e profissionalismo e através de todos os instrumentos do direito angolano e internacional”, podem estar em causa os salários e obrigações das empresas.
No entanto, em anterior comunicado, a PGR tinha sublinhado que para garantir o normal funcionamento das empresas, cujas participações sociais foram arrestadas a seu pedido, o tribunal indicou como fiel depositário os próprios conselhos de administração e o Banco Nacional de Angola. “Importa realçar que a presente providência cautelar não afeta os postos de trabalhos das empresas supra referidas nem os compromissos por ela assumidos, pois visa apenas acautelar o cumprimento de uma obrigação”, realça a nota.
Em entrevista recente ao Observador, Isabel dos Santos reagiu às mais recentes notícias e explicou a sua ausência do país desde 2018. “Em Angola, nos últimos dois anos, tem havido detenções sem o devido processo. Houve um deputado que foi detido a caminho de um avião, sem mandado… Houve várias situações em que a justiça não agiu bem. Sim, acho que hoje, para mim, Angola não seria um sítio seguro”. E, acrescenta ainda, “não há dúvida de que há uma tendência de fazer parecer que todos os males que havia na sociedade eram responsabilidade de um grupo pequenino de pessoas, que era o Presidente e a sua família — e mais nada. Mas acho que já ninguém acredita nisto”.
Para a empresária angolana, esta decisão trata-se de “um ataque politicamente motivado, pelo facto de filiação ao ex-presidente da República, José Eduardo dos Santos”. Isabel dos Santos diz ter tido conhecimento, com “grande consternação”, que houve um “julgamento secreto realizado em sigilo total”. Este julgamento, acrescentou, “contém várias inverdades e que se tivesse sido oferecida a oportunidade de um processo legal justo e aberto, teria sido fácil de desmontar tais inverdades“.
Por cá, Ana Gomes, a ex-eurodeputada, atira culpas a Portugal por nunca ter investigado os negócios da família de José Eduardo dos Santos, por ter “gente muito poderosa”, da justiça à política, cúmplice da corrupção angolana. Ana Gomes vai mais longe e diz que Isabel dos Santos “não se pode queixar” da debilidade das instituições angolanas já que esta é uma “consequência do esquema da cleptocracia que foi instaurada em Angola pela família dos Santos”.
Na sequência de todo este processo, a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) “está a acompanhar as implicações” da decisão judicial de arresto de bens da empresária angolana. Em declarações à Lusa, fonte oficial disse que a “CMVM está a acompanhar as implicações da referida decisão judicial, designadamente no que respeita a eventuais obrigações de prestação de informação ao mercado por entidades nacionais”.
Num artigo publicado pela revista “Forbes“, assinado pelo jornalista e ativista angolano, Rafael Marques e por Kerry A. Dolan, é investigada a fortuna de Isabel Santos, considerada a primeira bilionária em África e a verdadeira história de como conseguiu a sua riqueza.
“Tanto quanto podemos investigar, todos os grandes investimentos angolanos detidos por (Isabel) dos Santos vêm ou de ficar com uma parte de uma empresa que quer fazer negócios no país ou de um assinatura presidencial que a inclui na ação”, escreve a “Forbes“. A história de Isabel é considerada “uma janela rara para a mesma e trágica narrativa cleptocrática que estrangula os países ricos em recursos em todo o mundo”.
Portugal captou investimento angolano nos últimos anos, com a maioria concentrada nos setores da energia, banca e telecomunicações, grande parte através da empresária Isabel dos Santos, filha do antigo chefe de Estado de Angola, José Eduardo dos Santos.