A diretora-geral da Evolve RH, Inês Luís, tem conduzido a empresa com a mesma determinação que a levou a criá-la em plena incerteza económica: acreditar que inovação e proximidade fazem parte de um mesmo caminho. Entre a ousadia de implementar modelos como a semana de quatro dias e a aposta contínua no equilíbrio entre razão e sensibilidade, defende que o futuro do trabalho em Portugal dependerá da capacidade de valorizar as pessoas, e de transformar essa valorização em produtividade sustentável.
O seu percurso até à direção-geral da Evolve parece ter seguido uma linha natural de afirmação. Como olha para esse caminho e quais os momentos que considera mais marcantes no seu crescimento profissional?
De facto, olhando para trás, o meu percurso até à direção-geral da Evolve foi um processo natural, mas também muito consciente. Numa altura em que a economia ainda se estava a recompor, tomei a decisão de criar uma empresa que refletisse a minha visão e identidade — uma organização onde a inovação, a proximidade e a excelência fossem pilares fundamentais.
Foi um risco calculado, mas que fez todo o sentido. Lançar um projeto numa altura em que a economia ainda dava sinais de fragilidade exigiu determinação e uma forte convicção naquilo que queria construir. Tive desde o início a preocupação de criar uma marca com identidade, propósito e consistência. A confiança dos clientes — que acreditaram na Evolve mesmo antes de termos provas dadas no mercado — foi essencial. Esse voto de confiança foi o verdadeiro motor do nosso crescimento e consolidou o compromisso com a qualidade, a proximidade e a entrega de valor real.
Momentos marcantes houve muitos, mas destacaria a capacidade de resistirmos a contextos desafiantes, mantendo o foco na qualidade e na confiança na relação de credibilidade construída com os nossos clientes. Cada etapa representou uma aprendizagem valiosa, e foi graças ao empenho, talento e espírito de colaboração de uma equipa geograficamente dispersa – mas sempre alinhada nos mesmos objetivos – que conseguimos superar obstáculos e crescer de forma sustentável.

Olhando para a sua forma de liderar, parece haver um equilíbrio constante entre a assertividade dos resultados e a empatia pelas pessoas. Transportando essa filosofia para a prática, recorda-se de um momento marcante na sua carreira em que ter essa dupla perspetiva foi absolutamente decisivo para o desfecho de uma situação?
Com a pergunta, vem-me à memória uma situação. Ouvi falar de um projeto-piloto que seria implementado em Portugal, o “4 Days Week”, que consistia em, a cada duas semanas de trabalho, os colaboradores terem direito a um dia para usufruírem como quisessem, sem qualquer tipo de desconto por parte da empresa. Pensei que seria uma excelente forma de proporcionar um maior equilíbrio entre a vida pessoal e profissional dos colaboradores da Evolve, mesmo sabendo que o desafio seria manter a produtividade.
Quando apresentei a ideia à Equipa, para meu espanto, ela foi recebida com enorme ceticismo. A principal preocupação era a possível quebra de produtividade e a ausência das pessoas no dia em que usufruíssem do ‘4DW’. Para mim, o mais fácil seria deixar tudo como estava e abandonar a ideia. No entanto, mostrei que fazia todo o sentido apostar no correto aproveitamento do tempo e na boa gestão das equipas, pois acreditava que os benefícios seriam para todos — e que, no final, a produtividade poderia até aumentar.
E deu certo. Criámos mecanismos de trabalho, como emails de grupo, fomentámos uma melhor gestão do tempo e transmitimos aos colaboradores que, para o projeto funcionar, dependia deles — era preciso agir como uma equipa, como um todo. Todos tinham de ser eficientes, caso contrário, o projeto estaria em risco. E foi — e continua a ser — um sucesso. O projeto terminou, e na Evolve evoluímos para o Work-Life Balance. Sem pessoas, não há resultados. E os nossos resultados são o reflexo direto das nossas pessoas!
Considera que esta conjugação de racionalidade e sensibilidade é uma exigência do tempo atual ou é sobretudo fruto da sua forma pessoal de estar?
Acredito que, para as dinâmicas funcionarem, devemos seguir aquilo que está no nosso “ADN”. Elas precisam fluir de forma natural — caso contrário, estaremos sempre em esforço. Por isso, acredito que essa conjugação reflete muito da minha forma pessoal de estar.
Como Darwin disse, a sobrevivência não é do mais forte nem do mais inteligente, mas sim daquele que melhor se adapta à mudança. Vivemos tempos diferentes — tal como, há dez anos, vivíamos tempos distintos dos de há 20 anos. São realidades diferentes, com desafios diferentes, mas, acima de tudo, é fundamental compreender e adaptar-nos às pessoas e às suas necessidades ou prioridades.
A racionalidade e a sensibilidade, quando conjugadas, não devem ser uma exigência apenas do tempo atual — devem ser uma exigência permanente. Somos seres humanos, e a sensibilidade para com os outros deve ser uma constante ao longo da nossa vida, e não algo meramente momentâneo. Por outro lado, a racionalidade é a capacidade de tomar decisões com base no que é melhor para todos e/ou para o futuro. Um sem o outro torna-se estéril — é na união entre razão e sensibilidade que conseguimos criar soluções verdadeiramente humanas e eficientes.

A decisão de integrar o programa-piloto da semana de quatro dias de trabalho, que referiu há pouco, despertou grande atenção pública. Que balanço faz dessa experiência até ao momento?
Como referi anteriormente, o balanço é francamente positivo, pois o projeto não foi algo meramente temporário — criou raízes na empresa, evoluindo para a implementação do Work-Life Balance. Não posso deixar de referir que o projeto aproximou os colaboradores da empresa: passámos a caminhar lado a lado. As relações têm de ser de win-win — proporcionar um maior equilíbrio com a vida pessoal sem comprometer a produtividade. Para mim, é um orgulho pessoal e profissional ver que os colaboradores reconhecem o esforço que a empresa faz por eles — é algo que me realiza profundamente, tanto a nível humano como enquanto profissional.
Na sua opinião, este modelo pode tornar-se referência em Portugal ou ainda estamos numa fase experimental e restrita a alguns setores?
O uso do termo “pode” é pertinente e não deixa de ser curioso. Idealmente, este modelo deveria tornar-se uma referência em Portugal, mas a realidade é que ficamos no “pode”. Pode tornar-se — e não deve — porque um projeto desta natureza tem de ser sinónimo de união. Não há “patronato” de um lado e “trabalhadores” do outro, há uma convergência de interesses, com ambos os lados a caminharem juntos. As empresas precisam arriscar e fazer tudo ao alcance para implementar este projeto — ou outro que se ajuste à sua realidade. Os colaboradores, por sua vez, têm de garantir que o projeto funcione, evitando quebra de produtividade.
Deve haver comunicação clara e objetivos bem definidos, para que qualquer quebra de produtividade seja rapidamente identificada, diagnosticada e resolvida. A relação não pode ser uma “guerra” sobre quem cede menos, mas uma parceria para avançarmos juntos, mais longe e unidos.
Acredita que a produtividade deve ser medida pela qualidade e quantidade de trabalho produzido e não pelo número de horas trabalhadas. Como é que essa filosofia se traduz em práticas concretas dentro da Evolve?
Acredito firmemente que a produtividade deve ser medida pela qualidade e quantidade do trabalho realizado, e não pelo número de horas que o colaborador permanece no local de trabalho. A filosofia do modelo ‘Work-Life Balance’ traduz precisamente esta ideia: ser mais produtivo em menos horas, valorizando o equilíbrio entre a vida profissional e pessoal.
Na Evolve, essa abordagem concretiza-se através de práticas concretas que promovem a autonomia dos colaboradores, flexibilidade e um ambiente que incentiva o foco nos resultados, em vez do controlo rígido do tempo. Acredito que quando as pessoas se sentem valorizadas e têm liberdade para gerir o seu tempo, produzem com maior qualidade e eficiência.

Quais considera serem as tendências mais fortes que irão moldar os recursos humanos em Portugal nos próximos anos?
Considero que nos próximos anos, os recursos humanos em Portugal serão marcados por algumas tendências essenciais. A escassez de talento qualificado, especialmente nas áreas tecnológicas, exigirá um maior investimento na formação e no desenvolvimento contínuo dos colaboradores. A diversidade, equidade e inclusão ganharão destaque, pois ambientes de trabalho mais inclusivos são fundamentais para o sucesso das organizações. A transformação digital continuará a otimizar processos e a melhorar a experiência dos colaboradores, enquanto a saúde mental e o bem-estar passarão a ser prioridades estratégicas, promovendo um equilíbrio saudável entre vida profissional e pessoal. Finalmente, o modelo de trabalho flexível, que mistura escritório e casa, vai continuar a crescer, exigindo líderes preparados para gerir equipas diversificadas e dinâmicas, alinhadas com as necessidades atuais.
Portugal tem vindo a afirmar-se como destino para empresas internacionais de várias áreas. De que forma considera que o setor dos recursos humanos pode contribuir para tornar o país mais competitivo e atrativo, tanto para investidores como para profissionais de talento?
Portugal tem vindo a afirmar-se como um destino cada vez mais atraente para empresas internacionais, e acredito que o setor dos recursos humanos tem um papel decisivo neste percurso. Na minha experiência, é através da valorização do talento e da criação de ambientes de trabalho inclusivos e estimulantes que conseguimos realmente destacar o país no mapa global.
Vejo os recursos humanos como um motor para a competitividade, porque são eles que ajudam as organizações a adaptarem-se rapidamente às mudanças, a investir no desenvolvimento contínuo das pessoas e a construir culturas organizacionais que promovem a inovação e o bem-estar. Quando conseguimos alinhar essas práticas às necessidades de profissionais qualificados, portugueses e estrangeiros, tornamos Portugal um local onde talentos querem estar e crescer.
Para mim, mais do que atrair empresas, trata-se de criar um ecossistema onde as pessoas se sintam valorizadas, motivadas e desafiadas. É esse ambiente, com recursos humanos estratégicos e humanos ao mesmo tempo, que fará do nosso país uma referência para investidores e para quem procura uma carreira com propósito.
Que impacto gostaria de deixar como diretora-geral da Evolve, tanto na empresa como no setor dos recursos humanos em Portugal?
O meu objetivo é gerar um impacto real de realização nas pessoas que trabalham na Evolve — que gostem de estar cá e sintam orgulho em fazer parte da empresa. Para isso, é essencial continuarmos a inovar, não só nos nossos serviços, mas também na forma como estamos presentes para as pessoas, criando o melhor ambiente de trabalho possível. Acreditamos que pessoas realizadas são mais produtivas, mas, acima de tudo, é fundamental que sintam que pertencem, que cada uma tem um papel importante num propósito comum. Quando todos percebem que fazem parte de algo maior, o sucesso coletivo torna-se também uma conquista individual.

O que mais a motiva: transformar a Evolve por dentro ou contribuir para uma mudança de mentalidades mais ampla no mundo do trabalho?
Acredito que a transformação interna da Evolve está diretamente ligada a uma mudança mais ampla — não apenas no contexto empresarial, mas também na forma como encaramos o mundo do trabalho. Ao criar padrões e metodologias orientados para a eficiência e a produtividade, sem nunca perder o foco nas pessoas, acabamos por contribuir ativamente para essa mudança global.
Com cerca de 1.500 colaboradores cedidos, a Evolve tem hoje um impacto significativo no tecido empresarial, alcançando empresas clientes, candidatos e colaboradores de forma transversal. Alguns marcos refletem esse compromisso com a excelência e a responsabilidade: somos certificados pela norma ISO 9001, em 2024 recebemos o selo de Empresa Certificada no Índice de Bem-Estar e Qualidade, e em 2025 tornámo-nos uma empresa reconhecida pela ONU como fornecedor sustentável. Este é o nosso caminho — e continuará a ser.
Vivemos numa verdadeira aldeia global, onde sistemas organizacionais bem estruturados podem servir de referência para outras empresas. Acredito que, ao implementarmos boas práticas e modelos sustentáveis, estamos também a contribuir para algo maior: um ecossistema empresarial mais equilibrado, humano e responsável.
Uma inspiração que a acompanha? Trato os outros como gostaria que tratassem os meus — com respeito, empatia e presença. Uma cidade/lugar onde se sente em casa? Qualquer lugar junto à praia. Uma qualidade que mais valoriza nas pessoas? Integridade Algo de que nunca abdica no seu dia a dia? Boa disposição |