Duas décadas de inscrição na prestigiada lista da UNESCO convidam a uma comemoração à altura. A celebração do aniversário redondo desta paisagem cultural que é um verdadeiro “poema geológico”, nas palavras de Miguel Torga, começou a 14 de dezembro e será estendida até ao próximo ano com iniciativas diversas.
É inegável a beleza cénica da paisagem feita de socalcos e muros do Douro Vinhateiro. Dependendo do ponto de vista, da altura do dia e do ano, toda esta envolvente assume cambiantes diferentes, uma verdadeira festa para o olhar de quem decide visitar a mais antiga região vitícola regulamentada do mundo. Ali a mão humana “não desvalorizou,” mas “antes enobreceu” a natureza, daí a classificação enquanto “Paisagem Cultural, Evolutiva e Viva” e não como “paisagem natural”. Dos 1154 sítios e bens com esta marca da UNESCO no mundo, apenas 16 são áreas de vinha, duas das quais em Portugal (Pico e Douro).
Quando se fala em Douro Património Mundial a referência é ao Alto Douro Vinhateiro que abrange 13 concelhos: Alijó, Carrazeda de Ansiães, Lamego, Peso da Régua, Sabrosa, São João da Pesqueira, Tabuaço, Torre de Moncorvo, Foz Coa, Armamar, Mesão Frio, Santa Marta de Penaguião e Vila Real. No setor do turismo, toda a região do Douro mais do que duplicou o número de visitantes, e em 2019 foi responsável por mais de meio milhão de dormidas em unidades hoteleiras. Números animadores mas que não compensam o maior problema deste território: a perda de população de 220 mil para 190 mil habitantes em 20 anos.
As celebrações da data arrancaram no passado dia 14 de dezembro, com uma sessão evocativa no Teatro Ribeiro Conceição, em Lamego, e estendem-se até ao próximo ano com concertos, exposições, eventos culturais, prémios, um ciclo de seminários e conferências, entre outras iniciativas. Ainda este mês de dezembro subiu ao palco do Teatro de Vila Real a primeira ópera original criada em Trás-os- Montes e Alto Douro “Mátria – Aqui na Terra”. Uma obra em dois atos de Fernando C. Lapa, com libreto de Eduarda Freitas inspirada nos “Contos da Montanha” e nos “Novos Contos da Montanha” de Miguel Torga. Aliás o Douro é uma presença constante na obra de um dos principais escritores portugueses. No miradouro de São Leonardo de Galafura, sobre uma pedra, está registado um excerto dos seus diários onde Torga descreve a paisagem duriense como “um excesso de natureza” e um “poema geológico”.
Haverá também uma reedição do Prémio de Arquitetura do Douro lançado há 15 anos pela CCDR-N para promover boas práticas de arquitetura no Património Mundial. Uma campanha de marketing vai ainda destacar histórias pessoais de 20 durienses anónimos que no seu dia a dia se dedicam a causas culturais e sociais no âmbito das mais variadas profissões. Na sede do Museu do Douro, no Peso da Régua (Vila Real) está patente até 2 de janeiro a mostra “Côa Douro” sobre a paisagem e o património dos dois territórios classificados pela UNESCO. Afinal na entrada para esta distinta lista os dois territórios andam quase de mãos dadas, com a classificação do Património Mundial do Côa a acontecer três anos antes. Já a Associação Vale d’Ouro assinalou a data sob a forma de reivindicação em defesa da linha ferroviária do Douro e da sua reativação até Espanha.