Há-os em vários formatos e são dinamizados por organismos públicos, livrarias independentes e até figuras conhecidas. Os clubes de leitura foram inventados por mulheres e, embora não seja um hábito cultural enraizado em Portugal, começa a haver opções.
“A palavra escrita ensinou-me a escutar a voz humana”, escreveu Marguerite Yourcenar no seu magnífico Memórias de Adriano, referindo-se aos méritos de uma leitura atenta. A literatura cria uma ponte entre o leitor e o “outro” e faz-nos viver vidas diferentes das nossas mesmo que sejam ficcionadas. Existir um lugar de partilha em “voz alta” para estas descobertas, tantas vezes transformadoras, faz todo o sentido.
No final do século XVII e XIX os chamados “círculos de leitura” começaram a ser dinamizados nos Estados Unidos e na Europa como resposta à exclusão das mulheres dos meios intelectuais. Deitavam mão a praticamente toda a ficção que encontravam e liam livros em conjunto em salas de aula vazias, casas de amigas e até em fábricas. Uma das precursoras destes “círculos” foi Margaret Fuller, jornalista, crítica, feminista e a primeira mulher a ter acesso à biblioteca de Harvard. Fundou um clube que convidava mulheres “desejosas de responder às grandes perguntas” existenciais, como “para que é que nascemos?”. Ainda hoje a continuidade da leitura em comunidade tem muito que ver com estas questões, segundo a socióloga Christy Craig.
No Reino Unido, Estados Unidos e Canadá as mulheres contribuem em 80% para o mercado ficcional livreiro. São também quem mais frequenta as bibliotecas, escreve em blogues sobre ficção literária e dinamiza clubes de leitura. Mesmo as celebridades mais citadas nesta área são mulheres: desde 1996 que o clube de Oprah Winfrey, com curadoria da própria, esgota algumas das suas escolhas no mercado. A actriz Reese Witherspoon tem colocado no mapa literário livros como “Lá, onde o Vento Chora”, o romance de estreia da septuagenária Delia Owens, entretanto adaptado a filme.
Criado em 2021 pela atriz e encenadora Sara Barros Leitão, o Heróides – clube do livro feminista funciona através de sessões sobretudo virtuais, com interpretação em língua gestual portuguesa, para cerca de 500 participantes que se inscrevem previamente. O apoio de várias editoras tem permitido espalhar os livros das sessões em locais públicos de várias cidades e o calendário para este ano já está definido. No dia 29 de abril será a médica Isabel do Carmo a dar o mote à sessão online onde se vai discutir o livro Poemas, de Hannah Arendt.
A Biblioteca Municipal Almeida Garrett, no Porto, tem um cube de leitura que se realiza quinzenalmente, às 18:30, naquele equipamento cultural. É exigida inscrição prévia e toda a informação está disponível na página das Bibliotecas Municipais do Porto. Livrarias independentes como a Flanêur, no Porto, e a Culsete, em Setúbal, também dinamizam clubes de leitura.
Na divulgação que a FNAC faz do Clube Estante FNAC, um “book club” mensal, a comunicação é informal e, percebe-se, dirigida aos muito jovens. Envolve livreiros e amantes de livros que mensalmente escolhem um tema sobre o qual é estimulada uma partilha constante nas redes sociais e também em presença. Uma iniciativa bem-vinda num país onde mais de metade da população não lê livros e onde a grande maioria dos inquiridos (77%) assume que os pais nunca os levaram a uma livraria.