Em 2017, a Assembleia Geral das Nações Unidas lançou a “Década do Oceano”, uma iniciativa que pretende unir os países de todos os cantos do mundo numa missão de proteger e conservar os Oceanos. Em Portugal, várias são as instituições que estão a contribuir neste sentido, como é o caso do Centro de Biologia Molecular e Ambiental (CBMA) da Universidade do Minho, com o seu projeto River2Ocean. Cláudia Pascoal, Diretora do CBMA, explica-nos em que consiste este estudo e os efeitos que pode ter na biodiversidade aquática da região do Minho.
Sobre o CBM
AInvestigação, Formação avançada e Sociedade são os três pilares da atividade do Centro de Biologia Molecular e Ambiental (CBMA). Fundado em 2008 como parte da Universidade do Minho, o Centro assume como principal objetivo proteger a biodiversidade e os ecossistemas, promovendo o bem-estar humano e preservando o legado natural para as gerações futuras. Para atingir as suas metas, os investigadores “utilizam abordagens baseadas em hipóteses e tecnologia de alto débito para desenvolver ferramentas de monitorização e gestão ambiental, produtos ou processos ‘bio inspirados’”, explica-nos Cláudia Pascoal, diretora do CBMA.
Sediado no Departamento de Biologia da Universidade do Minho, o CBMA oferece ainda formação avançada em áreas complementares, incluindo diversos Mestrados e Doutoramentos, estando também inserido no laboratório Associado ARNET – Rede de Investigação Aquática, o que, segundo Cláudia Pascoal, “veio estreitar e fortalecer a interação com outras instituições de I&D”.
No que diz respeito à interação com a sociedade, o CBMA “promove diversas ações de divulgação científica e recebe visitas aos seus laboratórios”, para além de organizar workshops e estabelecer parcerias com entidades municipais, decisores políticos e empresas do setor privado. Em 2017, o CBMA foi cofundador do Instituto de Ciência e Inovação para a Bio-Sustentabilidade (IB-S) que visa estabelecer uma harmonia entre o ambiente natural e construído numa parceira entre investigadores e o setor empresarial.
River2Ocean: O que é e como funciona?
No âmbito da Década do Oceano (2021-2030), o CBMA está a desenvolver o projeto River2Ocean com o objetivo de encontrar soluções para a “valorização e promoção da biodiversidade e dos serviços dos ecossistemas aquáticos na região do Minho”. Cláudia Pascoal afirma que a investigação e o aumento do conhecimento sobre a biodiversidade e os serviços providenciados por estes ecossistemas são as formas mais eficazes de combater as ameaças atuais enfrentadas pelos ecossistemas aquáticos. A coordenadora do projeto, Fernanda Cássio, acrescenta que é essencial alcançar “uma perspetiva holística que possa considerar as espécies, os habitats e as atividades humanas numa lógica de coexistência, considerando a relevância dos ecossistemas, mas também a sua importância económica, social e cultural”.
O projeto River2Ocean visa mapear a biodiversidade e os serviços atualmente fornecidos pelos ecossistemas da região, considerando as bacias de drenagem de água doce e as águas costeiras como um contínuo. Além disso, visa investigar soluções de base biológica/biotecnológica para o desenvolvimento de produtos e processos sustentáveis e eficientes, alavancando a bioeconomia da região.
O envolvimento dos stakeholders, como a Agência Portuguesa do Ambiente, as Águas do Norte, as Águas do Alto Minho, ou as comunidades intermunicipais, também tem sido “crucial” para o sucesso do projeto. Durante a sua vigência, os resultados são divulgados através de diversos meios de comunicação, incluindo a publicação de artigos científicos, a realização de workshops destinados aos stakeholders, a promoção de cursos de treino avançado e de webinares, e a participação em eventos destinados à divulgação de ciência.
Na prática, o River2Ocean engloba três linhas de investigação: avaliação da biodiversidade aquática e das pressões humanas na região do Minho; valorização e exploração da biodiversidade aquática; e gestão e conservação da biodiversidade aquática, desde os serviços dos ecossistemas até à perceção e à governança.
Estas linhas de investigação têm como principal objetivo criar “uma base de dados da biodiversidade aquática, de habitats e de pressões na região do Minho”, para melhor gerir estes ecossistemas. Adicionalmente, está a ser criado um “biobanco de microrganismos marinhos com potencial biotecnológico para a prospeção de moléculas ou de processos com interesse industrial”. Estão ainda a ser desenvolvidos “métodos de DNA ambiental para a deteção e gestão sustentável de peixes com importância comercial na região do Minho.”
De acordo com Fernanda Cássio, o estudo exaustivo da biodiversidade aquática está a permitir a identificação das principais alterações que se fizeram sentir nos últimos 20 anos, bem como as espécies, comunidades e habitats em maior risco. Esta investigação tem provado que é necessário “implementar práticas de gestão do território mais sustentáveis para atenuar os efeitos das alterações climáticas com consequências para a quantidade e qualidade de água disponível para as diversas atividades humanas.” Os estuários, as zonas costeiras e fluviais têm provado ter elevado potencial para fornecer serviços culturais dos ecossistemas e as políticas de gestão ambiental devem considerar os múltiplos serviços providenciados pelos ecossistemas. Já a bioprospeção dos microrganismos marinhos produziu resultados promissores para a biorremediação e produção de compostos com interesse industrial.
Este projeto oferece ferramentas para a identificação de áreas prioritárias de conservação baseadas na biodiversidade aquática, o que pode ajudar os decisores políticos na tomada de decisão sobre o alargamento de áreas protegidas, como preconizado pela Estratégia Europeia para a Biodiversidade 2030 que prevê o alargamento das áreas protegidas terrestres e marinhas até 30% do território. Além disso, o Plano de Recuperação e Resiliência também pode auxiliar no restauro de áreas prioritárias de conservação já identificadas. Os stakeholders locais têm, também, um papel fundamental na colaboração para o desenvolvimento sustentável e para a manutenção dos serviços providenciados por estes ecossistemas.
Apesar do foco ser a região do Minho, Cláudia Pascoal afirma que o mesmo racional pode ser utilizado em outras áreas geográficas. “Vários investigadores do CBMA desenvolvem soluções semelhantes às utilizadas neste projeto, aplicando-as a outras regiões em Portugal e mesmo a outros países.
”Pela multiplicidade de temas e pelas três linhas de investigação complementares, este projeto pode ser um marco para o CBMA, “pelo envolvimento de muitos investigadores com diferentes áreas de atuação, e pela utilização de tecnologias de última geração para a monitorização da biodiversidade”. “Além disso, os resultados que estamos a obter colocam em destaque a necessidade de atuar nesta região, o que implicará um trabalho futuro por parte da equipa do CBMA no sentido do acompanhamento da evolução das estratégias de gestão”.