Lígia Rosa sempre ambicionou ser advogada, graças ao sonho que tinha de mudar o mundo. Formou-se na área e desde muito jovem começou a exercer advocacia. Apesar das adversidades com que se deparou ao longo da carreira, atualmente partilha um escritório com mais duas profissionais e é uma mulher de sucesso.
Antes de mais, pedia-lhe que nos contasse, resumidamente, o seu percurso profissional até à atualidade.
Iniciei a minha jornada no mundo da Advocacia ainda muito jovem. Agreguei em junho de 2003 e decorrido pouco mais de um ano fui mãe, abri o meu primeiro escritório numa pequena aldeia, tinha o meu filho poucos meses de vida. Não foi fácil, cresci no seio de uma família humilde, vi os meus pais trabalharem de sol a sol para nos proporcionarem, a mim e ao meu irmão, a formação que temos hoje.
A minha mãe foi e é, sem dúvida, a minha grande fonte de inspiração. Com ela aprendi que, com esforço, trabalho e dedicação, nada nos pode abalar. Comecei por exercer em prática individual num pequeno escritório em Águas de Moura, no concelho de Palmela. Foi uma experiência desafiante e enriquecedora. Decorridos mais de 20 anos, ainda mantenho muitos desses clientes, que muitos outros “me trouxeram”.
Exerço Advocacia em prática individual há 22 anos. Não é fácil exercer no feminino, no início deparei-me com alguns obstáculos pelo facto de ser mulher e muito jovem, aos poucos fui seguindo em frente e os obstáculos foram sendo ultrapassados. Com o passar do tempo, fui conseguindo demonstrar o profissionalismo e a total entrega com que me dedico a todas as causas, e é desta forma que pretendo continuar a exercer a Advocacia.
O que a motivou a enveredar pelo caminho da Advocacia?
Sempre quis ser advogada, o “sonho naïf ” de criança era o de querer mudar o mundo, nunca o conseguirei fazer, mas sigo feliz por saber que todos os dias está ao meu alcance mudar um pouco do “mundo” de cada um dos meus clientes. Vivo do exercício da Advocacia, é certo, mas o que me move, é ter a capacidade de ajudar os outros.
Atualmente, atua em que áreas do Direito?
Exerço em várias áreas, principalmente, crime, família, trabalho e cível. Foram muitos anos a exercer sozinha. Por mais complicado que possa parecer, nunca recusei um desafio. Neste momento integro um escritório com duas colegas, e já me/nos é possível fazer uma triagem dos processos por áreas de atuação, o que até aqui não me era permitido fazer, porque trabalhava sozinha.
“A maior força está na inteligência, na perspicácia, na capacidade de gestão de conflitos, na forma como se reage e como se abordam os temas”
Ao longo da sua vida profissional deparou-se com obstáculos que a impactaram. Quais as razões que não a fizeram desistir da profissão?
A fase mais difícil da minha vida profissional foi, sem dúvida, o assalto de que fui vítima no meu escritório, em Setúbal, seguido de fogo posto. No entanto, agora olho para trás e percebo que este trágico acontecimento foi a alavanca para deixar de exercer Advocacia no singular. Foi muito difícil, fiquei sem nada, mas reergui-me.
Nasceu em mim uma força inabalável, percebi que o que digo diariamente aos meus clientes – nesta vida só a morte não tem solução – também a mim se aplica. Já agradeci por diversas vezes a todos os colegas que me ajudaram, mas nunca é demais agradecer. Obrigada a todos, foi com a vossa força e com o vosso apoio que consegui superar.
O Dia Internacional da Mulher lembra-nos os desafios significativos que as mulheres, em particular as advogadas, continuam a enfrentar em setores ainda dominados por homens. Consegue enumerar um ou outro problema que continuam a enfrentar?
Felizmente, no mundo do Direito os tempos evoluíram e, atualmente, a grande maioria dos Advogados e Magistrados já são mulheres. Foi uma luta estoica, não podemos esquecer que em Portugal só em 1918 foi permitido às Mulheres iniciarem o exercício da Advocacia.
Nunca é demais enaltecer a Doutora Regina Quintanilha, a primeira mulher a licenciar-se em Direito em Portugal, relembrando que “inquiriu as testemunhas e (…) ao ser-lhe dada a palavra, d’ella usou durante algum tempo com muito brilhantismo, deixando em todos a impressão de que de futuro, a dedicar-se à carreira da Advocacia, muito há a esperar da sua intelligência”. Assim escreveu o jornal “A Luta”, a 15 de novembro de 1913, a propósito da estreia de Regina Quintanilha como Advogada, ainda antes de decretada em Portugal a permissão às Mulheres para o exercício da Advocacia, o que só veio a acontecer em 1918.

Na sua opinião, o que devia ser feito para conduzir à igualdade de género na advocacia?
Acredito que já existe igualdade de género na Advocacia, lamentavelmente o que não existe são Direitos Sociais. No meu ponto de vista, e no que respeita à igualdade de género, o problema ainda está na cabeça de quem solicita a prestação dos nossos serviços. Ainda existem muitos portugueses que pensam que um Homem Advogado tem mais “força” que uma Mulher Advogada.
Desenganem-se, a maior força está na inteligência, na perspicácia, na capacidade de gestão de conflitos, na forma como se reage e como se abordam os temas, na tenacidade, e até mesmo no silêncio, quando o podemos utilizar como “arma”. Na Advocacia, meus Senhores e minhas Senhoras, a “força” é o que menos falta faz. É uma questão de mentalidade, mas a seu tempo todos conseguirão perceber que Homem ou Mulher, não é isso que define um bom Advogado.
Quais as suas expectativas para o futuro?
Dificilmente conseguirei mudar o mundo, mas tenciono continuar a exercer a minha profissão de forma livre e independente e, com a maior honra, como tenho feito até aqui. Sempre em salvaguarda dos direitos e dos interesses dos meus constituintes, não fazendo qualquer distinção em função do género, sexo, ideologia ou religião.
Que mensagem gostaria de deixar a mulheres que estejam, neste momento, a formarem-se em Direito?
Tudo o que consegui foi a pulso. Se eu consegui, vocês também conseguem. Não desistam. Estudem, dediquem-se, trabalhem. Não é fácil, mas também não é impossível. Não deixem de acreditar, mas quando conseguirem atingir os vossos objetivos, não se esqueçam das batalhas que tiveram de travar, porque foram elas que vos conduziram ou conduzirão à vitória. Acreditar e trabalhar, esta é a melhor mensagem que vos posso deixar.
LÍGIA ROSA – ADVOGADA LIGIAROSA-18978L@ADV.OA.PT AVENIDA 5 DE OUTUBRO, N.º 2, 1º ANDAR 2900-308 SETÚBAL |