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EDITORIAL | EDIÇÃO 56 | AGOSTO 2025

Era uma tradição antiga, dos anos de ouro da televisão, haver um anúncio publicitário que marcava o verão e nos deixava a todos com a música no ouvido. Não é todos os dias que um anúncio nos desarma, ainda menos quando já vimos tantos. Mas há campanhas que parecem não querer vender-nos nada, ou pelo menos disfarçam bem, dominando com mestria a arte do storytelling. Preferem acender uma memória, devolver um cheiro antigo, ou apenas lembrar-nos de quem éramos quando ainda não tínhamos tanta pressa.

Foi assim em 2008, com o anúncio “Momentos”, gravado no Porto, para a Super Bock. Entre bares bem conhecidos da cidade, na rua Passos Manuel, a cidade empresta o cenário a olhares furtivos, gestos sedutores contidos, beijos que chegam como promessa do que está para vir. A canção, “The Story”, de Brandi Carlile, parecia escrita para aquilo, e há até quem diga que aquele foi o melhor vídeo clip possível para a música.

“Todas estas linhas no meu rosto / contam-te a história de quem eu sou / mas essas histórias não significam nada / quando não tens ninguém a quem contá-las / é verdade, eu fui feita para ti”

Dezasseis anos depois (2024), outro anúncio a uma marca de cerveja, agora a espanhola Estrella Damm, conta-nos a história de uma jovem que refaz os passos de alguém que já partiu. Numa autêntica curta-metragem, o “Verano ‘78” é uma viagem pelo tempo, mas sobretudo interior. Fala-nos de uma herança de verão guardada em fotografias e silêncios. Planos cruzados entre presente e passado, entre a protagonista e a mulher que lhe antecedeu, evocam uma dança de espelhos. O que herdamos, o que procuramos, o que perdemos… e aquilo a que voltamos. A música, “Yes Sir, I Can Boogie” das Baccara, interpretada numa versão moderna por Debbie serve de fio condutor revivalista perfeito.

São dois filmes separados por quase duas décadas, mas que parecem dialogar entre si. O primeiro é sobre o que começa; o segundo, sobre o que permanece. Ambos têm o verão como cenário e a memória como matéria. Ambos recusam o artifício e apostam na verdade emocional. E essa fórmula bem conhecida só falha quando não é bem executada.

Quando no segundo anúncio acompanhamos a protagonista a ouvir a mensagem, gravada em vídeo nesse verão de 1978, a dizer-lhe “isto é o importante”, acompanhamos a sua decisão de viver a sua vida e entregar-se à descoberta, em vez de ficar apenas presa às memórias de um passado que não era o seu, apesar de lhe dizer tanto. Era essa a verdadeira herança que essa outra mulher (mãe, avó, tia? Não sabemos, nem importa) lhe queria deixar: eu vivi e fui feliz, sê tu também!

Se voltarmos a ver o “Momentos” de 2008 depois do “Verano ’78”, a narrativa completa-se num círculo perfeito que se fecha, com o que começa e o que permanece a ficar eternamente ligado.

Bom verão, com muitas memórias e vida!