Com uma história e paisagem sem fim, Beja assume há pelo menos dois mil e quinhentos anos a centralidade do Sul de Portugal. Não se estranhe, por isso, que a região, e esta cidade gravada de história e cantares que chegam ao céu, se tenha desde cedo assumido como um eixo importante nos Caminhos da Fé que levavam a Santiago. Hoje, para atravessar este que é um dos Concelhos com maior área do país, e com uma paisagem em acelerada mutação, mas que conserva ainda uma beleza admirável, são cerca de 50 quilómetros de Caminho numa dificuldade relativamente baixa.
Em tempos mais distantes, e no contexto caminheiro, Beja seria ponto de afluência de três possíveis rotas de peregrinos: uma que saía do Algarve central (Faro), passando por Loulé, Santa Cruz, Almodôvar, Rosário, Castro Verde, Entradas, Trindade, Beja; outra que, proveniente do sul da Andaluzia, cruzaria o Guadiana no sudoeste algarvio, subiria até Mértola, Trindade, Beja; a terceira, já referida no texto, cruzaria a fronteira em Vila Verde de Ficalho e seguia por Serpa até Beja. Na continuação das suas viagens a caminho de Santiago de Compostela, os peregrinos seguiriam depois de Beja por duas rotas, ambas conduzindo até Évora: Beja, Alvito, Évora e Beja, Ferreira do Alentejo, Torrão, Évora.
Nos dias de hoje, o Caminho entra em Beja a Sul, depois de se atravessar o limite Norte do Parque Natural do Guadiana e a encantatória Ribeira de Terges. A direção é a Cabeça Gorda, terra de nome curioso, mas que no coração do Alentejo é repositório de mil maravilhas naturais, como a famosa amanita ponderosa, cogumelo nestas terras conhecido como silarca e que dá nome a um festival desta freguesia rural.
Daí o caminho segue para Beja, destino que se recomenda demorado e onde poderá contemplar vestígios do grande povoado que aí terá existido antes da chegada dos romanos que tornaram Beja, ou Pax Iulia, na designação latina, numa das mais importantes cidades da Península Ibérica. Desse passado encontrará ecos no Museu Regional, no Núcleo Museológico do Sembrano, e na Villa Romana de Pisões. Mas há tanto mais para conhecer, não fosse Beja afinal cidade de histórias intermináveis. O seu Castelo, onde encontrará também o Posto de Turismo com mais informações para lhe dar sobre Beja e o Caminho, e os vários museus da cidade são ideias para o fazer. Mas também as ruas são caminhos e pedras que contam, sussurrando parte do passado árabe e medieval, ou do impacto de novas traças urbanísticas ordenadas nas épocas renascentista e moderna. E com tanta coisa para ver e escutar, é imperativo não esquecer a arte contemporânea que ganha destaque no Museu Jorge Vieira, agora instalado na Casa do Governador, no Castelo de Beja, ou o património imaterial da região sintetizado no Centro UNESCO para a Salvaguarda do Património Cultural Imaterial. Não será também a tradição oral, a transmissão de histórias de geração em geração, uma parte essencial da magia do Caminho?
De Beja o Caminho segue até Cuba, cruzando campos e herdades e onde a planície pura se espraia num horizonte sem fim. Para atrás fica o seu Castelo, que com a sua imponente Torre, vigia esta planície sem fim. Não há melhor percurso do Caminho que este para perceber a dádiva que nos dá a terra. Beja, como Centro do Sul, é ponto de paragem obrigatória no Caminho, mesmo que seja no seu quente verão.