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EDITORIAL | EDIÇÃO 42 | DEZEMBRO 2023

O inverno serve muitas vezes de alegoria perfeita para definir o fim, o último capítulo. Mas no ciclo incessante da natureza o fim é também o princípio, se não do mesmo, de outra coisa qualquer, em constante transformação. O dia mais pequeno do ano, no solstício de inverno, é por sua vez o ponto de retorno ao crescimento que atingirá o ponto máximo no verão, altura em que estes voltam a minguar.


É assim inevitável fazermos balanços de 2023 enquanto formulamos desejos para 2024. Infelizmente, depois de Guerra ter sido escolhida a palavra do ano passado, na habitual iniciativa da Porto Editora, esta não só continua, na Ucrânia, como se alastrou a Israel, com os olhos e preocupações do mundo a centrarem-se novamente na Faixa de Gaza.


Para quem se habituou a viver em paz, ver a diplomacia dar lugar à guerra é um retrocesso dramático. Outras gerações, noutros tempos, terão tido sensações semelhantes, lembrando a célebre frase de Karl Marx, de que a História se repete, “a primeira vez como tragédia, a segunda como farsa”.

Quem definiu singularmente uma dessas épocas, mais concretamente o final do século XIX e princípio do século XX, foi o escritor austríaco Stefan Zweig. Chamava ele a esse período “a idade de ouro da segurança”. Uma altura em que “tudo parecia ter os seus alicerces na perenidade, e o próprio Estado era o garante supremo” dessa estabilidade. Depois sabemos bem o que aconteceu, a partir de 1914.


Estes excertos que citei são do livro “O Mundo de Ontem”, acabado de ser reeditado pela Relógio D’Água. No seu prefácio, e num tom totalmente oposto ao Zeitgeist atual, Zweig escrevia: “Nada me é mais alheio do que colocar-me em primeiro plano, a não ser como comentador de uma apresentação de diapositivos; a época proporciona as imagens, eu só profiro as palavras que as acompanham”. E, prossegue: “não será tanto o meu destino que comento, mas o de toda uma geração – a nossa geração única, carregada de destino como quase nenhuma outra no decurso da história.”


São vozes como estas que precisamos de ouvir mais – generosas, humanistas e pacifistas. Que o Mundo de amanhã volte a ter a paz e a prosperidade que, seguramente, todos desejamos.


Feliz 2024!