Chega ao escritório, abre o portátil e mal começa a escrever, surge o primeiro email. Depois, um telefonema, três mensagens, um colega que chama. No fim do dia, a agenda ficou cheia, mas a cabeça… vazia. Cada vez mais líderes reconhecem o preço deste modo de operar e redescobrem o valor do silêncio produtivo.
Entre reuniões encadeadas, mensagens instantâneas e a pressão da multitarefa, os momentos de verdadeira concentração tornaram-se raros. O termo deep work, cunhado pelo professor e autor Cal Newport, refere-se precisamente à capacidade de nos dedicarmos a tarefas cognitivamente exigentes com concentração total, sem interrupções. E esse estado de atenção profunda é, segundo Newport, uma das competências mais importantes do século XXI.
A ideia pode parecer romântica, quase anacrónica, mas começa a ganhar espaço entre líderes empresariais que reconhecem os limites do imediatismo. Bill Gates, por exemplo, reserva há décadas o que chama de Think Week — semanas isoladas em que lê e reflete, longe da rotina da Microsoft. Também o realizador David Lynch, ao ser questionado sobre a sua criatividade, respondia que “se queres apanhar um peixe grande, tens de ir para águas profundas.”
A analogia é eficaz: ideias verdadeiramente inovadoras raramente surgem em ambientes saturados de estímulos. São, quase sempre, fruto de introspeção e de tempo reservado ao pensamento, um espaço que não se conquista sem esforço.
As empresas mais sensíveis a estas dinâmicas já começaram a adaptar-se: há quem institua manhãs livres de reuniões, “zonas de silêncio” nos escritórios ou políticas internas que desencorajam o envio de emails fora do horário laboral. Algumas empresas escandinavas foram mais longe, instituindo dias da semana livres de reuniões, chamadas ou interrupções internas, para que os colaboradores possam concentrar-se apenas em tarefas exigentes, uma espécie de dia de concentração total dentro do calendário laboral.
Mas o deep work não depende apenas de estruturas externas. É, sobretudo, uma decisão pessoal. Exige disciplina, autoconhecimento e uma dose de coragem para se dizer não, seja a notificações, a urgências alheias ou a distrações travestidas de produtividade. Como nos ensinou o personagem interpretado por Robin Williams em O Clube dos Poetas Mortos, “a medicina, o direito, os negócios e a engenharia são nobres e necessárias para sustentar a vida. Mas a poesia, a beleza, o romance e o amor… são essas as razões pelas quais vale a pena viver.” Talvez o deep work seja a forma possível de recuperar essa beleza, em contexto de trabalho: ao escolhermos pensar melhor, também estamos a escolher viver (e liderar) melhor.