Caminhar sobre as árvores com os pés bem assentes no chão. Foi esta a frase que me surgiu quando comecei a tentar construir este editorial. Podia ser poesia, mas também consegue ser arquitetura e engenharia. Porque há estruturas, como as árvores, que se elevam naturalmente, não para impressionar. Erguem-se para a sua função, para durar, para devolver alguma ordem ao mundo. O facto de nos deixarem maravilhados a olhar para elas não é intencional, é uma consequência.
O passadiço de Serralves, por exemplo, é uma forma sólida de reaprender a altura das coisas, a escala da natureza, o silêncio que nos corrige. Feito em madeira, como que a lembrar que não se constrói contra a paisagem, mas com ela, o Tree Top Walk é um gesto arquitetónico sem arrogância. Não tenta reinventar o planeta, propõe escutá-lo.
A mesma empresa que o construiu (num projeto do arquiteto Carlos Castanheira, em colaboração com Álvaro Siza Vieira) foi também chamada a erguer o atelier de Ai Weiwei em Portugal. Uma réplica do seu antigo estúdio de Xangai, que nasceu sem pregos, com materiais locais, e um teto propositadamente desalinhado, como quem desafia a ordem e a desordem num mesmo gesto. Um edifício “sem propósito”, segundo o próprio artista, que vive no Alentejo sem lhe chamar casa, mas que ali encontrou espaço para caminhar, pensar e construir.
Na verdade, cada vez mais apetece regressar a esta ideia de que construir é escutar. Que o que se edifica, seja num território, numa marca, numa vida, precisa de tempo, sentido e contexto. Não há pressa que resista ao que é feito com raízes.
Também no turismo, essa área onde tantas vezes se confunde a mera presença com a presença de espírito, há quem prefira criar laços para além da rentabilidade. Não se trata só de alojar turistas, mas de receber gente; não apenas de ocupar camas, mas de construir pontes entre pessoas, lugares, memórias.
É também esse o espírito da nossa capa desta edição: uma empresária que, ao fundar a sua marca, partiu do desejo de construir algo autêntico, eficiente e conectado com o território. Trata-se de uma escolha consciente, exigente, de quem sabe que o turismo não se resume a taxas de ocupação ou a volume de receitas sazonais. Exige uma atenção contínua ao detalhe, ao lugar e às pessoas, e uma capacidade de criar laços que resistam ao tempo e à volatilidade do setor.
E, no fundo, quem constrói passadiços, quem ergue ateliers, quem recebe pessoas, demonstra a mesma vontade de não ser apenas passageiro, mas de conduzir a sua vida e deixar alguma marca que não se apague. De escutar, de respeitar, de permanecer, mesmo quando tudo à volta convida ao efémero. Caminhar sobre as árvores, sim, mas com os pés bem assentes no chão.