Destaque Mulheres Inspiradoras

“A liderança que construí vem menos de palco e mais de presença, a verdadeira, que começa dentro de casa, dentro de nós”

É mãe de seis filhos, empreendedora, mentora e CEO de um movimento que junta centenas de mulheres. Sofia Pereira recusa a ideia de que o sucesso exige sacrifício e defende um novo modelo de liderança, onde a estratégia e a autenticidade são indissociáveis. Partindo da sua história, explica como o caos da maternidade se tornou a sua maior escola de gestão e por que razão “respeitar o próprio ritmo” é o princípio mais revolucionário para qualquer negócio.

Sofia, ao longo do seu percurso foi construindo uma presença marcante no universo da liderança feminina. Para além da imagem pública e do que se partilha nas redes, há algum traço seu, menos visível, que ajude a perceber como tudo começou?

Começou no silêncio. No meio da rotina intensa de uma casa com seis filhos, entre fraldas, reuniões e pausas para respirar. O que hoje é presença visível nasceu de uma escuta profunda — de mim para mim mesma. Sempre fui guiada por uma inquietação: será que a vida que estou a viver me representa mesmo? Essa pergunta moveu tudo. O que pouca gente vê é que, antes de orientar outras mulheres, precisei resgatar a minha própria voz. Sempre senti que o sucesso, para mim, teria de ter alma. O que pouca gente vê é que a minha liderança nasceu do conflito entre querer expandir o meu impacto no mundo e, ao mesmo tempo, manter a minha verdade intacta. Nunca me alinhei com os modelos prontos. Sempre fui movida por uma visão: criar espaço para mim e outras mulheres que não querem encaixar-se, mas sim expandir.

A coragem de dizer “não quero continuar assim”. A coragem de redesenhar uma vida, mesmo quando por fora tudo parece “dar certo”. A liderança que construí vem menos de palco e mais de presença, a verdadeira, que começa dentro de casa, dentro de nós.

Há alguma grande inspiração na sua vida, uma pessoa, um exemplo, uma memória… que a acompanha desde sempre e que, de certa forma, a guiou até aqui?

Mais do que uma pessoa, foi uma decisão: a de me tornar a protagonista da minha própria história. De não viver à margem da minha vida para sustentar a ideia de sucesso dos outros. O que me guiou até aqui foi esse pacto interno, de viver de forma inteira, com liberdade e com impacto. Isso exigiu renascimentos. E é isso que me inspira todos os dias: ver outras mulheres a reescreverem as suas histórias com coragem.

A maternidade ocupa um lugar central no seu discurso, mas também certamente na sua rotina. Que aprendizagens inesquecíveis trouxe ser mãe de seis filhos ao modo como gere projetos, lidera equipas ou acompanha outras mulheres?

Ser mãe de seis ensinou-me o que nenhuma escola de negócios ensina: a liderar com presença. Aprendi a priorizar com intuição e estratégia. A confiar no processo. A perceber que o caos não é o contrário da ordem, é parte dela. Ser mãe de seis deu-me músculo emocional, tolerância à frustração e coragem para não seguir modelos prontos. Tudo o que trago para as mulheres que acompanho vem dessa escola viva: a própria Vida.

Cada filho trouxe-me um novo ritmo, uma nova forma de escutar e de criar. Levo isso para tudo o que faço. Não acredito em produtividade a qualquer custo. Acredito em impacto com alma. E é por isso que tantas mulheres se identificam comigo, porque sabem que é possível crescer sem se perder.

Houve algum catalisador específico (pessoal, profissional ou emocional) que a fez repensar as prioridades ou redesenhar de raiz o percurso no empreendedorismo?

Houve um momento em que olhei para tudo o que tinha construído e pensei: “Está bonito por fora, mas e por dentro?” Foi esse desconforto que me fez parar, realinhar e criar algo que não só tivesse sucesso, mas tivesse sentido. O catalisador foi perceber que já não me via no que estava a liderar. E, a partir daí, não aceitei menos do que merecia!

Redesenhei com coragem e determinação. Esse processo deu origem a tudo o que faço hoje. Passei a construir com base em valores, não em tendências. E isso muda tudo. Hoje sei: o redesenho é o começo da liberdade.

O que faz uma mentora de negócios alinhados no seu dia a dia? O que distingue, de facto, este trabalho de uma consultoria tradicional?

Uma mentora de negócios alinhados não entrega um plano, devolve visão, identidade e clareza. O meu trabalho é unir estratégia e verdade. Ouço além do que é dito, vejo o que está por trás das metas, e ajudo a desenhar negócios alinhados ao seu Eu, à sua Vida e definição de Sucesso.

O que mais me inspira nas mulheres que acompanho é o momento em que, no meio do caos ou do sucesso, elas decidem escutar-se de novo. Voltar ao centro. Refazer rotas. Tenho o privilégio de acompanhar mulheres brilhantes, muitas delas já com negócios ativos, com famílias, equipas e projetos relevantes, e é nesse ponto, quando decidem viver com mais verdade, que algo poderoso acontece: deixam de apenas construir e começam a expandir com propósito e verdade!

A grande diferença? Eu não ensino fórmulas prontas. Ensino a viver alinhadas, com um negócio que respeite quem elas são. O verdadeiro alinhamento entre vida & negócio é o que se torna extraordinário.

Como funciona, na prática, uma comunidade de mulheres mobilizada no mundo digital enquanto forma de apoio? Há algum episódio, recado ou projeto nascido do “M&M | Mulheres em Movimento” que ilustre esse impacto?

M&M > Mulheres em Movimento não é apenas uma comunidade, é um movimento real de mulheres que decidiram crescer juntas. Uma comunidade mobilizada começa com um espaço onde as mulheres podem ser inteiras. Onde há escuta sem julgamento, partilha sem competição, inspiração sem pressão.

Nas M&M já aconteceram colaborações inesperadas, parcerias que nasceram de conversas nos bastidores e até negócios que se transformaram a partir de uma partilha vulnerável. Um dos momentos mais marcantes foi quando, num evento, uma mulher disse: “Pela primeira vez senti que não precisava parecer forte para ser vista.” Isso é impacto.

“O meu papel é criar espaços onde as mulheres se sintam seguras para serem reais. Onde a vulnerabilidade é bem-vinda, e não sinal de fraqueza”

O digital é apenas a ponte. O que acontece ali é mais profundo: conversas de bastidores que viram parcerias, lágrimas que se transformam em ideias, e eventos que são verdadeiros espelhos de poder. Mulheres em Movimento é um espaço de liberdade com intenção, onde ajudo mulheres a liderarem vidas & negócios com verdade, coragem e sucesso, de dentro para fora.

Consegue identificar padrões recorrentes de bloqueio ou resistência entre as mulheres empreendedoras que acompanha? O que, em concreto, as faz avançar?

O padrão mais visível? Mulheres que tentam ser perfeitas em tudo e se perdem de si mesmas. O medo de falhar, de ser julgada, de não dar conta. O bloqueio mais recorrente é o medo de não corresponder à imagem que criaram para si mesmas. Muitas sentem-se prisioneiras da própria performance. Carregam sozinhas, tentam ser tudo para todos e esquecem-se de si.

O que as faz avançar não é a pressão, é a permissão, para parar, para redefinir, para fazer de outra forma. Quando se libertam da comparação e voltam a escutar o seu ritmo, o movimento recomeça, com verdade. Avançar não é sobre ir mais rápido. É sobre não se perder no meio do processo.

Como gestora de uma comunidade que vive entre o apoio e a inspiração, como equilibra a partilha honesta de dúvidas e vulnerabilidades com a necessidade de manter um discurso motivador e positivo?

Eu acredito que a verdade inspira mais do que a perfeição. O meu papel é criar espaços onde as mulheres se sintam seguras para serem reais. Onde a vulnerabilidade é bem-vinda, e não sinal de fraqueza.

Equilibrar isso é deixar claro: há força no choro, há beleza na dúvida. O discurso inspirador não é o que motiva a qualquer custo, mas sim o que valida o caminho como ele é. E isso, sim, transforma tudo!

Eu inspiro e lidero. Sou o caminho para muitas outras mulheres. Vivo o que partilho. Sou a prova viva de que as Mulheres podem ser empoderadas e liderarem negócios extraordinários, com estratégia, visão e impacto.

“Uma mentora de negócios alinhados não entrega um plano, devolve visão, identidade e clareza”

Há algum hábito, rotina ou princípio de gestão do tempo que recomende vivamente e sente que pode transformar não só negócios, mas também vidas?

Sim, respeita o teu ritmo. O tempo só se organiza com verdade. Se estiveres a viver num tempo que não é teu, não há agenda que resolva. Sem dúvida, a clareza de intenções antes da gestão do tempo é o que faz toda a diferença. Muitas mulheres tentam encaixar tudo numa agenda apertada, mas esquecem de definir o que realmente importa. O que transformou a minha vida foi alinhar as minhas prioridades enquanto mulher, mãe e empreendedora, antes de preencher qualquer calendário.
Um hábito que recomendo é o que chamo de “Agenda Alinhada”, começo cada semana com três perguntas: O que precisa mesmo de mim? O que pode esperar? E o que é ruído? Só depois defino os meus blocos de tempo. Esta consciência transforma rotinas e traz paz ao processo. E isso muda tudo!

Que mito sobre alta performance feminina gostaria de ver desmistificado de vez nas próximas gerações?

O maior mito é o de que a alta performance exige sacrifício constante, sobrecarga e masculinização da liderança. Essa ideia de que para sermos bem-sucedidas temos de estar sempre em modo “ação”, sem pausas, sem descanso, sem espaço para sentir, é destrutiva. A verdadeira alta performance feminina é cíclica, alinhada, intuitiva e profundamente sustentável. É possível liderar negócios e projetos de alto impacto sem nos perdermos de nós mesmas. Precisamos de normalizar uma performance que respeita o corpo, a mente, a maternidade e o tempo interno de cada mulher. Não é sobre fazer tudo, mas fazer o que realmente importa, com consciência. É saber parar. É dizer não. É criar uma vida que te sustenta, e não que te consome. Isso é poder feminino. Isso é o novo sucesso!

Como gostaria de ver a evolução da liderança feminina em Portugal na próxima década? Que transformações considera urgentes?

Quero ver mais mulheres em lugares de decisão sem terem de deixar partes de si pelo caminho. Quero que liderar seja sinónimo de liberdade e não de sacrifício. É urgente normalizar o equilíbrio, valorizar o tempo de pausa, integrar a maternidade no mundo profissional sem culpa. Sonho com um Portugal onde o sucesso feminino não seja medido apenas por cargos ou faturação, mas também pela coerência entre vida pessoal, valores e impacto social. Precisamos de mais mulheres a liderar com voz própria, e menos a repetir o que sempre foi feito.

No seu podcast “Vozes que Inspiram”, houve alguma conversa, resposta ou crítica que tenha mudado a sua forma de orientar e escutar mulheres?

Sim. Houve um momento marcante com uma convidada que disse: “Tu inspiras-me e decidi dar o passo que andava a adiar por medo do julgamento e de que não era capaz. Lancei o meu negócio com coragem porque tu realmente és inspiração.”

O podcast é libertador para que outras mulheres possam expandir, fazer acontecer e dar aquele passo que tanto esperavam. Percebi que, tantas vezes, o que elas precisam não é de estratégia, mas de escuta. De uma presença que diga: sim, é possível crescer sem deixar partes tuas pelo caminho. Todas nós temos uma história, um caminho percorrido, entre desafios e sonhos e, através da nossa voz, podemos inspirar outras mulheres a fazer algo mais por si e pelo seu negócio.

“Respeita o teu ritmo. O tempo só se organiza com verdade. Se estiveres a viver num tempo que não é teu, não há agenda que resolva”