Justiça

“A Justiça há muito que se encontra esquecida”

Um inquérito realizado pelo Instituto de Políticas Públicas e Sociais, do ISCTE – Instituto Universitário de Lisboa, revelou que a Justiça é a instituição pública mais mal avaliada pelos portugueses. Marina Mata, advogada especializada em várias áreas de atuação, dá-nos o seu parecer acerca dos resultados deste estudo.

Cerca de 74% da população portuguesa afirma que o sistema funciona “mal” ou “muito mal”. Enquanto advogada, que explicação encontra para que a avaliação tenha sido esta?

Creio que a perceção que a maioria da população terá da Justiça prende-se, essencialmente, com o que é veiculado pela comunicação social, nomeadamente com os megaprocessos. Estes, pela sua especial complexidade, demoram anos a ser solucionados, sendo que o comum cidadão crê que traduzem o sistema num todo. Não estou com isto a querer dizer que a Justiça não enfrenta problemas, antes pelo contrário, visto que se encontra esquecida, por parte do Estado, há muito anos. Como é que os processos podem ser solucionados se não existem infraestruturas dignas e funcionários judiciais, magistrados, juízes e órgãos de polícia criminal suficientes para dar resposta a todos os processos?

A maioria dos inquiridos considera que os juízes e procuradores são vulneráveis e cedem a pressões com “muita” ou “alguma frequência” por parte da comunicação social, grupos económicos e sociais, do governo, dos partidos da oposição e dos Presidentes da República. Na sua opinião, o que seria plausível fazer para que a opinião dos cidadãos acerca do sistema passasse a ser mais positiva?

Nem os juízes, nem os procuradores são pressionados pelos meios de comunicação social ou por outros fatores externos. Aliás, caso assim fosse, jamais haveria julgamentos envolvendo políticos, bancários, empresários, entre outros. Os órgãos judiciais são imparciais e essa imparcialidade acarreta opiniões díspares. A meu ver, apenas com a condenação de pessoas influentes, caso se venha a provar que cometeram algum tipo de ilícito, é que a opinião dos cidadãos mudará.

Estando a Marina Mata a par de como funciona a Justiça em Portugal, concorda com o posicionamento de quem integrou este estudo?

Não podemos afirmar que a Justiça está de boa saúde, até porque, atualmente, existe um total desrespeito por ela, em Portugal. Se o Estado não investe nos tribunais, na abertura de concursos para admissão de funcionários judiciais e nos valores que são pagos a todos aqueles que fazem parte da Justiça portuguesa, como é que o sistema pode funcionar bem? O desinvestimento, infelizmente, acarreta consigo a morosidade. O que é manifestamente grave!

Relativamente ao futuro, um quarto dos inquiridos mostra-se pessimista e antecipa uma maior degradação do sistema. Como vê a Justiça portuguesa nos próximos anos?

A Justiça é um dos pilares do Estado de Direito Democrático, pelo que o próprio Estado deverá fazer um investimento em toda a sua estrutura, quer a nível das infraestruturas, quer a nível financeiro, pagando valores dignos a todos aqueles que dela fazem parte. Só assim estará apta a servir as pessoas, de forma digna.