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Visitar Barcelos pela “estrada que liga o Norte”

Ligando o Norte de uma extremidade à outra, do litoral ao interior, a Estrada Nacional 103 tem todas as condições para se afirmar como uma das melhores road trips de Portugal. De Viana do Castelo a Bragança, atravessa o Minho e Trás-os-Montes ao longo de muitas e apetecíveis curvas. Fomos percorrê-la com o tempo que uma rota destas merece. A nossa primeira paragem é em Barcelos, no coração do Minho.

Com tanta História para contar ao longo destes mais de 250 quilómetros, em boa hora o Turismo do Porto e Norte de Portugal se lembrou de juntar esforços com os 12 municípios atravessados pela Estrada Nacional 103 para a promover. Tudo leva a crer que o lançamento oficial se faça nos últimos meses deste ano, avança-nos uma fonte da Câmara Municipal de Barcelos. Esta é uma das autarquias que mais se tem esforçado por levar o projeto para a frente, e nós iremos acompanhar todo o processo.

O quilómetro zero fica numa rotunda em Neiva (Viana do Castelo), na ligação com a nacional 13. Daí vai descendo em direção a Esposende e rapidamente entramos em Barcelos. Um dos municípios que está na base da criação deste projeto da Rota da Nacional 103, e um dos que tem mais quilómetros desta estrada ao longo do seu território. É também aqui que cruzamos o rio Cávado pela primeira vez, nesta estrada que o acompanha desde o concelho onde desagua (Esposende) até aquele onde nasce, na Serra do Larouco Montalegre). E se é certo que o podemos atravessar confortavelmente pela nova variante da cidade, a melhor opção é fazê-lo pela Ponte peregrinos de Santiago, claro. É um dos símbolos de Barcelos, com os seus arcos góticos e quase 700 anos de História.

A localização do concelho de Barcelos é bastante curiosa, podemos mesmo dizer estratégica. A cidade de Braga fica ali mesmo ao lado (Este), a uma curta viagem de 15 minutos, enquanto a poente ficam as praias de Esposende. Conflui a norte com o alto Minho (Viana do Castelo e Ponte de Lima), e a sul já com o distrito do Porto (Póvoa de Varzim). Tem por vizinhos ainda Famalicão e Vila Verde. Por esta descrição se percebe que estamos na presença de um vasto território com a particularidade de ser o município com mais freguesias de todo o país – 61 – sendo que eram 89 antes da reorganização administrativa.

Com a EN103 a atravessar a cidade, muito do trânsito que tradicionalmente ali passava (e continua a passar) leva gente de Braga rumo às praias de Esposende, ou pessoas do litoral a caminho de Braga ou do Gerês, por exemplo. Mas desengane-se quem pense que Barcelos ocupa “apenas” um lugar de charneira nesta confluência de caminhos em todas as direções da Rosa dos Ventos. É um concelho com uma enorme riqueza cultural, patrimonial, natural e gastronómica.

Desde logo destacamos o centro histórico da cidade. Faz-se facilmente a pé e é uma autêntica gema de História e bom ambiente. Recantos, esplanadas, cafés e pastelarias cruzam a antiguidade deste espaço com a juventude que se respira nas ruas.

A Igreja Matriz, o Cruzeiro do Galo, a Torre Medieval, o Largo do Apoio, o Paço dos Condes de Barcelos e o Templo do Bom Jesus da Cruz (Palco central da Festa das Cruzes, em maio) são apenas alguns dos locais que não pode mesmo deixar de conhecer e são também argumentos capitais do caminho Português de Santiago.

O Galo e o Figurado de Barcelos
Mesmo quem nunca tenha estado em Barcelos conhecerá, de certeza, o seu símbolo mais identificativo – o Galo de Barcelos. Um ícone da cidade e da portugalidade cujas origens remontam ao campo das lendas (ver caixa) e que identifica o país em qualquer parte do mundo. Não estivéssemos nós na região que viu e fez nascer Portugal.

Lenda do Galo de Barcelos

É um dos símbolos mais imediatamente reconhecíveis de Portugal – o Galo de Barcelos, que salvou a vida a um peregrino de Santiago. Este seria galego e acabou por se tornar suspeito de um crime que ninguém conseguia resolver na cidade. Apesar de clamar pela sua inocência acabou condenado à forca, desacreditado por todos os que o ouviram. Num último recurso pediu para ser apresentado ao juiz antes da execução. Como último desejo do condenado, acabaram por lhe conceder a audiência, levando-o a casa do magistrado. Este estava a oferecer um banquete a alguns amigos, e foi aí que voltou a ouvir as juras de inocência do peregrino. Perante a incredulidade geral proferiu a célebre frase, apontando para um galo assado que estava sobre a mesa de jantar: “É tão certo eu estar inocente, como certo é que esse galo vai cantar quando me enforcarem”. Os risos e a troça iniciais deram lugar ao maior espanto quando, pouco depois, o galo se levantou mesmo e começou a cantar! O Juiz correu então à forca e mandou soltar o homem, que estava já com a corda ao pescoço, mas acabou por se salvar porque o nó estaria mal feito. Anos mais tarde o peregrino regressa a Barcelos e manda erguer o Cruzeiro do Senhor do Galo, em homenagem a Santiago e à Virgem Maria. Este monumento é um dos espaços nucleares do Caminho Português de Santiago.

A internacionalização desta simpática e colorida figura de barro terá começado em 1935, na Exposição de Arte Popular Portuguesa, em Genebra. A partir de meados do século passado a sua ascensão como símbolo turístico nacional é óbvia. Com o passar dos anos o ícone não se perdeu e soube modernizar-se, como podemos ler no site da Câmara Municipal, o Galo de Barcelos ultrapassou o “contexto que o forjou e reinventa-se como símbolo de um país que, acima de tudo, oferece ao mundo Liberdade.” É um Portugal “moderno, empenhado na sua universalização, enquanto destino turístico” aquele que se revê neste Galo que é, afinal, de todos nós.

Hoje, em vários pontos da cidade, o Galo de Barcelos, nas mais diversas variantes estéticas, vai dando uma cor e um ambiente muito particulares a Barcelos. Ele e muitas outras réplicas gigantes que fazem parte do roteiro (obrigatório) do Mundo Maravilhoso do Figurado de Barcelos. São 18 peças emblemáticas espalhadas pela cidade (uma delas do outro lado do Cávado, em Barcelinhos) da autoria do escultor Albino Miranda. Há de tudo um pouco, desde a Junta de Bois, uma Cabra, o Casal de Minhotos ou uma Diaba. Ainda os Santos Populares (S. João e Sto. António) ou o delicado Presépio da Bilha, entre outros. E claro, não podemos deixar de visitar o Museu da Olaria com as suas mais de nove mil peças de cerâmica e olaria do Minho e de todo o país. Há até workshops e sugestões para meter as mãos literalmente na massa que “dá vida” a estas belíssimas peças do nosso imaginário. É esta cultura criativa das gentes de Barcelos que elevaram a cidade a membro da Rede Mundial das Cidades Criativas da Unesco, no domínio do Artesanato e Arte Popular, em 2017.

À mesa em Barcelos: um regalo para os sentidos
Para além do artesanato a expressão máxima do Galo de Barcelos faz-se à mesa. Aqui o galo assado é uma iguaria verdadeiramente única, e são muitos os excelentes restaurantes em que o pode apreciar devidamente. Esta receita recria o galo da lenda do Galo que salvou o peregrino da forca. Mas as sugestões gastronómicas não se ficam por aqui. O Minho é a terra do Sarrabulho e as papas, em Barcelos, são diferentes. Há ainda a Lampreia do rio Cávado ou o arroz pica no chão, e as muitas variações do bacalhau. Há mesmo quem chegue a dizer que o melhor bacalhau do mundo se come em Barcelos. Uma coisa podemos afirmar – pelo menos a Mista de Bacalhau com Polvo vai ter mesmo de provar numa das vezes que visite Barcelos.

E para acompanhar estes pratos divinais o melhor emparelhamento só pode ser um bom Vinho Verde de Barcelos. E aqui começa outra demanda – as opções são muitas e destacam-se pela qualidade. Há ainda quem pense que o Vinho Verde é só para beber muito gelado não o apreciando devidamente. Peça-o à mesa, ou ainda melhor, visite uma quinta e prove alguns dos melhores Loureiros e Arintos (entre outros) que se produzem no nosso país. O enoturismo continua a crescer na região e vai perceber facilmente porquê.

A Feira de Barcelos
Qualquer dia é um bom dia para visitar Barcelos, mas se o fizer a uma quinta-feira tem a oportunidade de visitar a “feira das feiras de Portugal”. Muito famosa, sobretudo no norte do país, faz-se, pelo menos, desde inícios do século XV, e mantém a sua identidade tradicional e rural, com produtos de grande qualidade. Realiza-se, claro está, no Campo da Feira, bem no centro da cidade, e aqui negoceia-se de tudo um pouco, com destaque para o artesanato, louças de Barcelos, olaria, cestaria, têxteis e trabalhos em madeira ou ferro. O ambiente, a dimensão, a cor e a vida desta feira garantem uma verdadeira experiência de imersão popular e cultural.

Do muito mais que há para descobrir e viver em Barcelos, sugerimos que visite o site da Câmara Municipal, onde poderá encontrar guias, roteiros e contactos que o vão ajudar certamente a planear da melhor forma a sua visita à Capital do Artesanato, Cidade Criativa da UNESCO e Creative Friendly Destination.