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Hasankeyf, a cidade Turca de 12.000 anos que irá ficar submersa

Na Turquia, uma barragem hidroelétrica vai ser o suficiente para afundar — literalmente — 12 mil anos de história. Hasankeyf, antiga cidade que fica no sudeste da Turquia e é considerada um “museu ao ar livre”, pode ficar submersa já no próximo ano.

Nos primeiros dias do próximo mês de outubro grande parte da cidade de Hasankeyf estará submersa. Situada junto ao caudal do rio Tigre, na província de Batman, no sudeste da Turquia, a cidade alberga cerca de 3 mil pessoas (às quais se juntam mais 3 mil se contarmos com pequenas populações rurais nos arredores).

Pensa-se que Hasankeyf seja um dos mais antigos assentamentos habitados continuamente na Terra, datando de 12.000 anos e contendo milhares de cavernas, igrejas e túmulos. Hasankeyf é mesmo considerada como um dos sete patrimónios mais ameaçados do mundo há vários anos e, em 1981, chegou a ser declarada como área de conservação natural.

Mas esta jóia da história humana em breve será perdida, a maior parte do assentamento está prestes a ser inundada como parte do altamente controverso projeto da barragem de Ilisu.

O governo construiu um “novo Hasankeyf” para 700 famílias, a 3 km da histórica Hasankeyf, para realocar os moradores antes de 8 de outubro.

A construção da barragem — a segunda maior da Turquia — motivou diversas queixas no Parlamento Europeu. Várias pessoas têm lutado pela conservação do local arqueológico e levaram mesmo a que vários países retirassem o apoio financeiro à construção da barragem. Ainda assim, Veysel Eroglu, ministro responsável pela infraestrutura, afirmou: “Não precisamos desse dinheiro. Vamos construir a barragem custe o que custar”. A obra, que começou em 2006 e terminou em 2018, foi financiada por bancos turcos.

Ercan Ayboga, ativista e engenheiro ambiental, acredita, no entanto, que ainda não é demasiado tarde: “Neste momento, só 1% do património cultural do vale do Tigre está danificado. A barragem vai demorar entre seis e 24 meses para encher, dependendo do caudal do rio. Se houver protestos na Turquia e em todo o mundo, ainda podemos salvar Hasankeyf”.

Ridvan Ayhan, nascido numa das cavernas de Hasankeyf, é um membro ativo da iniciativa “Manter Hasankeyf Viva”, criada em 2006. Numa entrevista ao The Guardian, Ridva Ayhan sublinhou “Não é apenas a nossa história, é também a tua história, porque estamos a falar da história da humanidade”.

Numa breve passagem sobre uma caverna marcada com uma cruz, conta que ali existiu uma antiga igreja, não se sabe em que ano a igreja remonta, o que relembra que apenas 10 por cento da área foi explorada por arqueólogos.

“Propusemos que esta área se tornasse num museu ao ar livre, mas o governo não aceitou”, disse Ayhan. “Se se fizessem aqui escavações encontraríamos culturas em camadas, umas sobre as outras”.

Hasankeyf fez parte de muitas culturas diferentes ao longo da sua história – incluindo a antiga Mesopotâmia, Bizâncio, impérios árabes e o império otomano. No entanto, Hakan Ozoglu, professor de história da Universidade da Flórida Central, em entrevista ao The Gardiana referiu que a vila é anterior a todas essas civilizações. “Temos referências da cidade em vários textos antigos, em diferentes idiomas, como assírio, armênio, curdo e árabe”, referiu.

O professor destacou que Hasankeyf é um laboratório de história e aqrqueologia que pode fornecer muitas respostas sobre o passado. “Tais evidências raras sobre o passado humano devem ser protegidas a todo custo”, salientou.

Do vasto património, apenas oito dos monumentos históricos – incluindo uma torre da universidade mais antiga do mundo, metade de um antigo portão romano da cidade e um hamam de mulheres que data por volta de 1400 – foram salvos. As peças foram movidas a 3 km de distância e agora ficam em uma vasta planície. “Não faz sentido para nós ver essas peças históricas lá”, disse Ayhan.