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O renascer da Raça Ramo Grande

A raça Ramo Grande esteve quase extinta, mas a Associação de Criadores de Bovinos da Raça Ramo Grande (ACBRG) reuniu esforços para evitar que parte da identidade e tradição dos Açores desaparecesse. Atualmente já livre do risco de extinção a raça é cada vez mais procurada por vários produtores pelas suas qualidades distintas que proporcionam queijos únicos e carnes saborosas.

A raça bovina do Ramo Grande, existente apenas nos Açores e representa parte da cultura e das tradições açorianas. Em julho de 2012, era formada a Associação de Criadores de Bovinos da Raça Ramo Grande, situada na ilha de São Jorge. O intuito era salvar a raça Ramo Grande da sua quase evidente extinção. “Foi uma forma de pressionar junto das entidades responsáveis uma forma de salvar esta raça”, conta-nos João Sequeira, presidente desta Associação. Atualmente a ACBRG visa genericamente a defesa dos legítimos interesses dos seus associados no que se relaciona com a preservação, melhoramento, criação e comercialização dos bovinos de raça Ramo Grande.

O reconhecimento da importância histórica e cultural do gado Ramo Grande, e a perceção de que estava em risco de se perder definitivamente o reduzido gado desta raça que restava, levou a que na década de 1990 ressurgisse o interesse por este gado e fossem efetuados os primeiros trabalhos de levantamento e caraterização que viriam a culminar com a instituição do Registo Zootécnico da raça em 1996. No entanto, apenas em 2012, com o culminar do surgimento da ACBRG esta raça viu o seu número de animais aumentar e ser valorizado na produção do queijo e de carne DOP.

Atualmente, a raça Ramo Grande está reconhecida, a nível internacional, pela União Europeia, pela FAO e encontra-se descrita na lista dos Recursos Genéticos Animais a nível mundial. Estão inscritos atualmente no Livro de Adultos desta raça 2400 bovinos, distribuídos pelas ilhas Terceira, São Jorge – com maior incidência -, Faial, Pico, São Miguel e Graciosa. Para este novo reconhecimento da raça João Sequeira destacou a intervenção da “engenheira Ana Luísa da Direção Regional do Desenvolvimento Agrário dos Açores, que teve um papel fundamental da valorização da raça”.

Parte da campanha de valorização e proteção da raça foi a utilização da seleção genómica, tornando-se a primeira raça bovina em Portugal a recorrer a este avanço para a sua reprodução, o que permitiu dar maiores garantias de produção.

Até aqui, a seleção dos bovinos para reprodução era feita apenas com recurso à informação genealógica e à informação fenotípica, mas agora existem também painéis de marcadores genéticos que permitem para um determinado animal varrer praticamente todo o genoma e saber quais são os marcadores que eles têm em determinadas posições. Portanto, os touros passam a ser selecionados, não só por aquilo que deveriam ser com base na genealogia, por aquilo que eles parecem ser com base na informação produtiva, mas também por aquilo que eles efetivamente possuem no seu património genético.

Origem e evolução da raça

Este animal autóctone foi introduzido nos Açores aquando do povoamento das ilhas, no século XV, e, dadas as características insulares e o isolamento geográfico, adquiriu características específicas que deram origem aos bovinos Ramo Grande.

Com o povoamento do arquipélago dos Açores no século XV vieram bovinos de diversas regiões do Continente. As raças introduzidas nos Açores foram as nacionais, tais como a Alentejana, a Mirandesa, a Minhota e a Algarvia que sujeitas à insularidade deram origem a um tipo de bovino de pelagem avermelhada, que era designado pela “raça da terra”, hoje também conhecido como a raça ‘vermelha dos açores’.

Durante séculos esta raça foi a força que desbravou a terra e a tornou produtiva. Estabeleceu-se uma relação harmoniosa do homem com a terra, mas também com os seus companheiros que puxavam o arado e as carroças carregadas de colheitas. Talvez por causa desse companheirismo secular, tenha surgido este animal tão submisso e que com o passar do tempo ganhou caraterísticas únicas. Estes animais eram por isso tratados como família e fartamente alimentados, pelo que se criavam grandes e gordos bois, que trabalhavam dois ou três anos e quando os lavradores tinham uma nova junta para os substituir, exportavam-nos para o matadouro de Lisboa.

Fruto da forte atividade económica surgiu de forma natural um grande intercâmbio genético entre as ilhas de São Jorge e da Terceira, o que levou a que esta raça se tenha espalhado pelas ilhas dos Açores.

A introdução em épocas recentes, de diversas raças exóticas nos Açores, fez diminuir a criação desta raça. No entanto, com os esforços dos produtores e da Associação de Criadores de Bovinos da Raça Ramo, a raça tem vindo a recuperar o seu efetivo e a ver valorizado os seus produtos.

Com a mecanização dos trabalhos agrícolas, este gado foi perdendo seu lugar de destaque na lavoura. Contudo, alguns criadores ainda os usam na lavoura. Esta raça, também conhecida como ‘vermelha’ também tem participações habituais em desfiles etnográficos e em feiras agrícolas.

O nome Ramo Grande é a designação comum da zona nordeste da ilha Terceira, no arquipélago dos Açores, conhecida como sendo uma região plana, bastante fértil onde existiam boas pastagens, abundância de milho e magníficos campos de luzerna, e também dos bovinos vermelhos e corpulentos que lá se desenvolveram, razões que levaram esta raça a ser reconhecida como Ramo Grande. A sua originalidade foi moldada pelo que a natureza lhe dá – a verdura dos campos, as vistas deslumbrantes e os ares do Oceano Atlântico. Tudo isto origina uma raça de animais de excecional capacidade de tração para produção de trabalho e aptidão para a produção de carne de grande qualidade e para a produção de queijo devido à qualidade do seu leite. Com a sua definição como raça autóctone houve um ressurgimento do interesse pela preservação deste património genético açoriano. Hoje a raça ‘Ramo Grande’ é um elemento fundamental nas festas e nos Cortejos Etnográficos.

A raça Ramo Grande na produção de carne e queijo

Os bovinos da raça Ramo Grande, caracterizam-se por apresentarem um esqueleto forte e articulações largas, além da sua enorme estatura. Sendo longilíneos, o terço anterior é mais desenvolvido que o posterior o que se coaduna com uma raça portadora de excecionais qualidades de trabalho.

A raça tem uma aptidão mista, sendo utilizada na produção de carne, na produção de queijo e ainda na utilização para trabalhos de agrícolas. A raça Ramo Grande apresenta uma carne de cor vermelho vivo, com tendência a ficar mais intenso em contato com o ar e com a idade do animal, de consistência firme decorrente da presença de tecido conjuntivo interfascicular em proporção variável e com cheiro aromático intrínseco da espécie. A gordura é bem distribuída, de cor branco nacarado e de consistência firme após o arrefecimento da carcaça.

A raça Ramo Grande é também utilizada na produção de queijo, tendo dado origem ao aclamado queijo da ilha de S. Jorge, um produto DOP que é uma das marcas dos Açores. Apesar de não produzir tanto leite como outras raças, devido ás suas características, apenas 6,5 litros de leite queijo (da raça Ramo Grande) correspondem à produção de um kg de queijo, enquanto noutras raças são necessários 13 litros.

A alimentação dos animais é efetuada de acordo com os moldes tradicionais de criação. A base da alimentação são as pastagens, naturais ou melhoradas, utilizadas por pastoreio direto e constituídas por consociações de gramíneas e leguminosas. Os bovinos adultos alimentam-se de erva fresca sendo suplementados com silagem de erva, feno, milho verde ou silagem de milho ou outros alimentos da exploração (milho em grão, brácteas secas do milho, rama de batata-doce, incensos) ou oriundos de outras explorações do Arquipélago dos Açores.