Será que é possível conciliar a vida profissional com a vida familiar e pessoal em contexto laboral? O Instituto Politécnico de Tomar (IPT) considera que sim e até obteve uma certificação a esse respeito. Em maio passado, esta instituição foi distinguida por ter uma política de conciliação entre as esferas profissional e pessoal dos seus trabalhadores.
Atribuído, apenas, a outras duas instituições de ensino superior portuguesas, o certificado do Sistema de Gestão de Conciliação pertence agora, também, ao Instituto Politécnico de Tomar. Uma distinção concedida às empresas que, através de políticas laborais flexíveis e integradoras, permitem que os trabalhadores conciliem as suas vidas profissional, familiar e pessoal. Esta certificação foi concedida pela entidade Bureau Veritas acreditada pelo Instituto Português de Acreditação (IPAC).
A IN Corporate Magazine esteve à conversa com Natércia Santos, pró-presidente para a Qualidade e Sustentabilidade do IPT e com Adélia Leal, responsável pela Divisão de Recursos Humanos, que nos explicaram os moldes desta certificação.
Quais são as principais preocupações e eixos orientadores da área da Qualidade do IPT?
Natércia Santos (NS) – O Sistema Interno de Garantia de Qualidade está mais voltado para os processos e respetivos procedimentos de trabalho e não tem como principais preocupações a qualidade de vida e as condições de trabalho dos trabalhadores. O Sistema de Gestão da Conciliação vem colmatar essa falha e faz parte integrante desse sistema mais abrangente, preocupando-se com o bem-estar dos trabalhadores dentro e fora da instituição. Embora já esteja na reta final do processo, o Sistema Interno de Garantia da Qualidade ainda não está certificado. Em maio, foi certificado o Sistema de Gestão da Conciliação, que partiu do projeto “Inspirar, Partilhar e Trabalhar – A vida merece tempo”, criado pelo IPT em 2019.
Quais são as práticas/políticas que adotam para a conciliação da vida familiar e pessoal com a vida profissional dos trabalhadores?
Adélia Leal (AL) – Temos, por exemplo, protocolos com entidades ligadas à saúde, ginásios, creches, entre outras… com descontos para todos os trabalhadores do IPT. Por outro lado, como temos dois tipos de trabalhadores no IPT: o pessoal docente e o pessoal não docente, com caraterísticas, medidas e regulamentos diferenciados temos medidas diferentes que se prendem com os horários. O pessoal docente tem um horário mais flexível e o pessoal não docente tem um horário mais rígido. No caso da amamentação, a lei tem um horário rígido, mas nós damos flexibilidade às pessoas para poderem optar pela distribuição dessas horas da forma mais conveniente. Outra medida com muita aceitação é a possibilidade de poder gerir/alterar 2 horas por mês, isto é dispor desse tempo para alguma questão pessoal e repor essas horas noutro momento, ao fim de um dia por exemplo na semana seguinte. No caso dos docentes, estes podem escolher, dentro do possível e sem prejuízo dos horários dos alunos, os dias em que pretendem lecionar para poderem ficar libertos para a parte da investigação. Por exemplo, os docentes podem trabalhar em casa na preparação das aulas ou podem concentrar as aulas em três dias da semana.
NS – No caso dos docentes, temos também a concentração dos horários. Por exemplo, os docentes não têm de dar as aulas todas nos dois semestres. No limite, podem ter um semestre sem aulas. Por vezes, um docente precisa de ir para fora, durante semanas ou meses, para fazer investigação no âmbito de projetos ou mesmo formação. Para isso, pode concentrar as aulas todas num semestre (desde que a média anual de aulas cumpra a legislação). A criação da sala de convívio para os trabalhadores também foi uma medida importante.
AL – Ainda há outra medida, no caso dos docentes, muito importante: se houver um dia em que o docente não possa vir dar uma aula, ele pode reagendá-la para outro dia, desde que os alunos tenham disponibilidade horária.
Qual tem sido o feedback dos trabalhadores (sejam docentes ou não docentes) a propósito destas medidas?
NS – O feedback tem sido muito positivo porque são práticas que agradam a todos nomeadamente a existência da sala de convívio.
De que forma a pandemia afetou as rotinas dos trabalhadores?
AL – Tivemos de ficar todos em teletrabalho, mas foi uma adaptação fantástica, foi de um dia para o outro, aliás, de uma manhã para a tarde. Houve uma adaptação muito boa por parte dos trabalhadores.
NS – A questão do teletrabalho era um dos objetivos do projeto “Inspirar, Partilhar e Trabalhar – A vida merece tempo”. Mal pensávamos nós que, em menos de um ano, seríamos forçados a isso. Aliás, no âmbito do projeto havia material/equipamento (computadores), precisamente para nós distribuirmos aos trabalhadores para lhes permitir o teletrabalho. Antes da pandemia, nós idealizávamos que os trabalhadores fizessem “dois dias por mês” em teletrabalho. E de repente isso tornou-se algo banal. Neste momento, temos a possibilidade de um ou outro trabalhador ficar em teletrabalho quando existe justificação. Antes de 2020 essa era uma questão que nem sequer colocávamos. Para um colaborador atualmente é possível, de acordo com a chefia e o tipo de trabalho, ficar uma semana ou dois ou três dias em teletrabalho para, por exemplo, dar apoio à família.
De que forma combatem o quiet quitting, ou seja, a ideia de que os trabalhadores (sobretudo os mais jovens) se limitam a executar o mínimo exigível para evitar o despedimento? Como promovem o sentimento de identificação dos trabalhadores e a vontade de “vestir a camisola” do IPT?
NS – Temos um corpo docente e não docente que não é propriamente jovem. Por isso, eu não conheço casos de quiet quitting no IPT. Temos desenvolvido uma série de atividades entre os trabalhadores para criar essa “Identidade IPT”. Por exemplo, no Dia da Família – 15 de maio, organizámos um piquenique para todos os trabalhadores (e respetivas famílias), para incentivá-los a “vestir a camisola”. Também organizámos caminhadas, sardinhada anual, jantar de Natal, celebrámos o Dia da Criança com os filhos dos trabalhadores… tentamos criar uma identidade “Eu Sou IPT”. Aliás, o nosso hashtag é mesmo esse. Foi também criada a Casa do Pessoal, constituída por docentes e não docentes, que organiza atividades lúdicas para aproximar as pessoas e criar o sentimento de pertença ao IPT.
Quais são as mais valias desta certificação (atribuída em maio) para o IPT?
NS – O Sistema de Gestão da Conciliação ainda é muito recente. Só foi certificado em maio. Mas eu sinto que, desde então, as pessoas estão mais ligadas ao IPT e que esta certificação foi muito importante no pós-pandemia. Durante a pandemia, estivemos cada um para seu lado e naturalmente perdeu-se o espírito de grupo. Neste momento, esse espírito está a voltar e espero que este sistema possa contribuir para que este se intensifique.